Em 6 de maio de 2013, a Disney e Electronic Arts anunciaram uma parceria que daria à publisher licença para produzir e lançar jogos baseados na série Star Wars para “todas as plataformas interativas” - PC, consoles e mobile - por um período de 10 anos.
A parceria foi declarada um mês após a Disney fechar a LucasArts, divisão de games da Lucasfilm que cuidou da marca Star Wars por mais de duas décadas, e que na época trabalhava no projeto Star Wars 1313, que acabou por ser cancelado.
Na época, o anúncio da parceria deixou parte do público receoso, já que por décadas a EA tem uma reputação negativa, seja por práticas de negócio consideradas predatórias a consumidores, ou por “assassinar” estúdios adorados como Westwood (de Command & Conquer), Origin (de Ultima e Wing Commander) e Pandemic (de The Saboteur, Mercenaries e - curiosamente - os primeiros Star Wars: Battlefront), sendo votada por várias vezes "a pior empresa dos Estados Unidos" pelo público do site The Consumerist.
Naquela época, inclusive, a EA sofria mais controvérsias após o lançamento e recepção negativas do último SimCity.
Ainda assim, havia motivos para se animar com a união da publisher à marca, já que os primeiros projetos envolveriam pesos-pesados na empresa, com a BioWare continuando a desenvolver o MMORPG Star Wars: The Old Republic, e novos jogos vindo da DICE (de Battlefield) e Visceral Games (de Dead Space) - o último com a direção criativa de Amy Hennig, a mente por trás das narrativas de Uncharted e Legacy of Kain.
Quase cinco anos se passaram desde o início da parceria entre a Disney e a Electronic Arts, e não é exagero dizer que os resultados até agora estão bem abaixo do esperado, entre produtos medianos, cancelados e até fonte de novas legislações contra jogos de azar.
Pelo lado mais positivo, após um lançamento e primeiros anos conturbados - antes mesmo da compra da Lucasfilm pela Disney -, a BioWare encontrou sucesso com Star Wars: The Old Republic, particularmente com as expansões Knights of the Fallen Empire e Knights of the Eternal Throne.
Apesar de estarmos muito longe da era de ouro dos MMORPGs, e de o game não ser o KOTOR 3 com que muitos ainda sonham, o jogo encontrou um público próprio e, por enquanto, rende um bom dinheiro para a EA.
Já Star Wars: Galaxy of Heroes, da Capital Games, é um jogo mobile em que o jogador pode formar diferentes equipes com heróis e vilões da franquia, combatendo inimigos em um sistema de batalha por turnos.
De acordo com dados da Sensor Tower, em 2017 o jogo faturou US$ 157 milhões, o que o torna um dos jogos mobile mais populares e rentáveis do ano - apesar de ser um número menor em relação a titãs como Clash Royale e Pokémon GO.
Quanto aos outros projetos…
Na E3 2013, poucos meses após o anúncio da parceria, a DICE divulgou um teaser trailer de seu novo jogo, Star Wars: Battlefront.
O jogo foi lançado dois anos mais tarde, mas apesar de ser um sucesso de vendas, com 12 milhões de unidades vendidas até o fim do ano, a recepção do público e crítica foi mista, com elogios aos visuais, combate e fanservice, mas criticado por falta de conteúdo - como, por exemplo, uma campanha singleplayer -, repetitividade e um sistema raso demais.
(Um crítico vocal da falta de modo offline, curiosamente, foi o ator John Boyega, que interpreta Finn em O Despertar da Força e Os Últimos Jedi.)
Mas nada que uma sequência não possa resolver, certo?
Anunciado em 2016 e com mais detalhes divulgados em 2017, Battlefront II parecia uma evolução de seu predecessor, corrigindo seus erros ao incluir uma campanha single-player e diferentes eras da série em seu multiplayer, dos prelúdios até os novos filmes da Disney.
Esta percepção começou a mudar em outubro, com a chegada do beta e a descoberta de que o jogo incluiria loot boxes. A situação piorou em novembro, quando o público descobriu por meio do acesso antecipado do EA Access que para desbloquear personagens como Luke Skywalker seria preciso gastar créditos, que poderiam ser ganhos pelo próprio jogo ou pelas caixas.
Uma estimativa feita por fãs indicava que seria preciso dois dias inteiros para desbloquear o conteúdo do multiplayer. Naturalmente, a ideia de gastar mais dinheiro após comprar um game por US$ 60 ou equivalente não agradou o público (para dizer o mínimo), e uma resposta da EA no Reddit defendendo o sistema recebeu a distinção infame de ser o comentário com mais votos negativos da história da rede social.
A repercussão foi tão negativa que legisladores de diversos países, incluindo Bélgica, EUA, Austrália e Alemanha consideraram expandir o conceito do jogos de azar e apostas para as lootboxes.
Em abril, a Bélgica classificou a venda destes itens como ilegais.
Logo após o lançamento do jogo, a EA removeu as microtransações de Battlefront II - supostamente por ordem da Disney após a controvérsia, segundo reportagem do The Wall Street Journal.
Naturalmente, a publicidade negativa foi uma grande pancada para a reputação do jogo, que vendeu 9 milhões de cópias até o fim de 2017, 1 milhão abaixo das expectativas da EA. Em março, a publisher revelou que lootboxes retornarão ao jogo, mas apenas para itens cosméticos.
Mas, mesmo com todos estes problemas, Star Wars: Battlefront II chegou a ser lançado. O mesmo não pode ser dito do projeto da Visceral Games…
Conhecido internamente como Ragtag, o jogo liderado por Amy Hennig - diretora criativa de Uncharted -, prometia ser um projeto extremamente ambicioso, em que o jogador controlaria o protagonista Dodger, que junto com um grupo improvável de companheiros enfrentaria um poderoso líder de gangue, lidando com os eventos entre o primeiro Star Wars e O Império Contra-Ataca.
Como conta uma reportagem especial do Kotaku, porém, o projeto estava fadado ao fracasso, seja pelos problemas anteriores da Visceral com Dead Space 3 e Battlefield: Hardline, a falta de intimidade de Hennig com o resto da equipe, o alto custo de funcionamento do estúdio, localizado na cara Baía de São Francisco, os longos tempos de aprovação de visual de itens e personagens por parte da Disney e da Lucasfilm…
A EA, de acordo com a reportagem, se esforçou para manter o projeto vivo, trazendo as equipes da EA Motive e mais tarde da EA Vancouver para ajudar no projeto. Por outro lado, os executivos da publisher temiam que um grande apelo para o público, já que apesar de trazer Star Wars no nome o game não teria Jedi, sabres de luz, uso da Força, etc.
No fim, o projeto foi essencialmente repassado para a EA Vancouver para uma grande reformulação, enquanto a Visceral Games foi oficialmente fechada pela Electronic Arts em outubro de 2017. No fim, tudo o que o público pode ver de Ragtag foram algumas imagens e um breve vídeo apresentado na E3 2016, com Dodger saindo de um edifício.
E este é o saldo dos jogos de Star Wars ao fim da primeira metade do acordo entre a Electronic Arts e a Disney, e o resultado é bem decepcionante, com poucos jogos chegando ao consumidor e nenhum deles podendo ser considerado verdadeiramente espetacular.
Embora estejamos em momentos bem diferentes da indústria de games, é impossível não comparar o trabalho da EA com a LucasArts envolvendo a franquia. Seria bondade demais dizer que a última não teve sua parcela significativa de fracassos, jogos ruins e projetos promissores cancelados, mas a finado produtora ainda foi capaz de criar vários títulos divertidos e inovadores durante as décadas.
Só entre 2000 e 2005, tivemos games como Rogue Squadron II, Jedi Knight II, Jedi Academy, os dois Battlefront da Pandemic, os dois Knights of the Old Republic - jogos que traziam algo de diferente para fãs, e poderiam ser curtidos até por quem não se interessa tanto por Star Wars.
A EA, ao que tudo indica, prefere tentar “apostas seguras”, mas ainda assim parece não conseguir atender às vontades do público, seja por medidas predatórias ou simplesmente por não trazer algo interesse o suficiente para manter a atenção por muito tempo.
Há projetos promissores para o futuro, já que a Respawn Entertainment trabalha em um novo jogo sob a direção de Stig Asmussen (de God of War 3), enquanto a Motive - que trabalhou com a Visceral em seu projeto cancelado e traz como produtora principal Jade Raymond, de Assassin’s Creed - está desenvolvendo um game de mundo aberto.
A esperança agora é que os projetos da segunda metade deste 10 anos superem os erros e problemas iniciais deste acordo.