The Evil Within 2 é um jogo estranho. Tudo sobre ele parece estar preso entre duas forças. Seu estilo de terror é um irmão do meio que quer ser Silent Hill mas não consegue se livrar das amarras de Resident Evil. Seu gameplay hora se mostra em sincronia com os avanços do meio, hora parece estar preso em 2008, perdido em corredores lineares e mecânicas de tiro imprecisas. Mas quando tudo está dito e feito, os desenvolvedores da Tango Gameworks mostram que entendem o que faz um bom survival horror, e terminam com uma das surpresas mais agradáveis do ano.
O primeiro The Evil Within marcou o retorno de Shinji Mikami, criador de Resident Evil, ao terror nos games. A história do detetive Sebastian Castellanos investigando uma espécie matrix do terror chamada STEM tinha várias marcas do desenvolvedor veterano. Criaturas com design assustador e uma narrativa confusa estavam, mais uma vez, lá. Agora, Mikami assume a posição de produtor e supervisor da continuação, e com todo respeito ao mestre, mas eu espero que ele se mantenha nessa posição, porque o resultado é claramente superior.
Em Evil Within 2, Sebastian retorna ao STEM, agora para resgatar sua filha, Lily. A garota tinha, aparentemente, falecido num incêndio, mas na verdade foi sequestrada pela corporação maléfica Mobius (a Umbrella desse mundo) para ser usada como núcleo de Union, uma cidade fictícia dentro dessa "matrix". Nunca fica exatamente claro por que Lily é especial, e o fato dela ter sido escolhida e Sebastian ser alguém que já tem experiência com o STEM não passa de uma coincidência, mas isso não importa muito quando as coisas começam a caminhar. Você aceita as bizarrices e aproveita o jogo.
A história do jogo continua meio confusa e há reviravoltas que parecem ter saído de uma cartola há cada meia hora, mas a experiência ainda é positiva muito por conta de dois personagens. Sebastian é um bom protagonista e sua progressão pessoal durante a história, mesmo que às vezes corrida, é satisfatória e suficiente para segurar bem o bastão. Além disso, um dos vilões, o bizarro fotógrafo Stefano, é um dos melhores antagonistas de terror nos últimos anos.
Claramente inspirado pela interpretação do psicopata Hannibal Lecter feita por Bryan Fuller na série de TV Hannibal, Stefano é bizarro o suficiente para deixar você sempre com os cabelos da nuca em pé. Ele fotografa pessoas em seu momento de morte e transforma isso numa espécie de exibição artística. Ele é fascinante, mas infelizmente The Evil Within 2 utiliza este personagem da forma errada, dispensando-o em boa parte da campanha para dar espaço para vilões cliché como padres satânicos ou bilionários sombrios. É uma pena, mas não tira o brilho das cenas com Stefano.
Mas o grande gancho de Evil Within 2 não é tanto a história quanto o gameplay. Ao contrário do primeiro jogo, a continuação mistura as seções lineares com corredores recheados de monstros com áreas abertas no estilo sandbox. Não chega a ser um mundo aberto, mas em determinados momentos do jogo, você pode explorar pedaços da cidades de Union ao bel-prazer. São nessas horas que o jogo brilha de forma incrível.
As áreas abertas de Evil Within 2 recompensam duas coisas: exploração e criatividade. Ao navegar pela cidade, entrando em prédios diferentes, procurando itens em lixeiras, caixas e becos, ou realizando as missões e objetivos secundários, você será constantemente recompensado com equipamento, armas e munição que abrem o leque das mecânicas. Esse leque, então, pode ser usado na forma como você lida com os inimigos que aparecem pela cidade. Seja plantando armadilhas, eliminando os monstros um a um usando a furtividade, ou se apoiando em elementos do cenários como barris explosivos ou poças de gasolina, há sempre mais de uma forma de sair de uma enrascada.
"As áreas abertas de Evil Within 2 recompensam duas coisas: exploração e criatividade"
E se algo der errado, você pode simplesmente se afastar, fazer com que os monstros o percam de vista, e tentar novamente. Você recebe as ferramentas, e cabe a você usar sua criatividade para usá-las. Estratégias inteligentes e criativas vão te ajudar a poupar munição, um fator sempre importante em jogos de sobrevivência como este. Em The Evil Within 2, você sempre está na beira do desconforto em termos de equipamentos, e o uso deles sem responsabilidade pode te colocar contra a parede rapidamente.
Uma das decisões inteligentes que a Tango faz com o jogo é não colocá-lo apenas nessas áreas. Durante as primeiras 6-7 horas da minha campanha (terminada em 16 horas), o ciclo de gameplay do jogo era uma mistura da exploração com áreas lineares onde o foco na narrativa era maior. Desta forma, nada fica enjoativo. Ao misturar essas duas coisas, The Evil Within 2 encontrou um ótimo ritmo. Isso, infelizmente, é quase abandonado na segunda metade do jogo em troca de corredores e mais corredores.
De vez em quando você ainda terá uma área mais ampla aonde ainda é possível usar a criatividade para encarar os desafios, e até mesmo em alguns corredores dá pra usar o que você aprendeu para economizar balas ou maximizar o dano feito aos inimigos. Mas é difícil não sentir falta dos momentos onde Evil Within 2 tira todas as amarras e deixa o jogador sobreviver como bem entender. Se essa série ganhar um terceiro jogo - e ao final da história fica claro que a Tango tem ideias para uma nova história - eu espero que os desenvolvedores vejam o que funcionou e apostem com mais confiança nisso.
O problema dos corredores é que, enquanto o ciclo de gameplay - aquilo que você faz na escala macro durante horas no jogo - as mecânicas de momento a momento como correr, atirar e escalar, são, muitas vezes, imprecisas ou estranhas. Nas áreas abertas é possível combater isso com a criatividade, mas quando você não tem pra onde ir a não ser pra frente, os defeitos ficam mais claros.
Finalmente, como um produto de terror, The Evil Within 2 também parece estar preso entre duas forças. O design de criaturas é ótimo nos chefões e monstros mais fortes, mas também não faltam "zumbis" sem inspiração. Este é um jogo que sofre com uma crise de identidade. Ele quer ter um peso psicológico relacionando elementos do STEM à culpa e tristeza de Sebastian, mas a forma como ele lida com essa conexão é mais através de encontros sangrentos e gritaria.
"A única coisa impedindo que The Evil Within 2 se torne um jogo memorável é ele mesmo"
No fim das contas, a única coisa impedindo que The Evil Within 2 se torne um jogo memorável é ele mesmo. Tanto no âmbito da sobrevivência quanto no terror, a Tango Gameworks dá sinais de estar fazendo algo novo e admirável, mas em diversos quesitos, a desenvolvedora não consegue se desprender de vícios antigos e desnecessários. Como resultado, temos um bom jogo que tinha tudo para ser ótimo.
The Evil Within 2 está disponível no PlayStation 4, Xbox One e PC. O jogo foi testado numa unidade do PlayStation 4 original. Clique no nome da plataforma para ver o preço da versão digital do jogo em cada uma.