Antes do império multimídia, antes das ligas de esports, antes de League of Legends, antes até mesmo da Riot Games em si, Brandon Beck e Marc Merrill sonhavam com um jogo que não seria abandonado por seus desenvolvedores.

Beck e Merrill não eram o tipo de dupla que é normalmente associada ao aspecto criativo da indústria de games: sem um passado significativo em ciências da computação, os dois eram estudantes de finanças que se conheceram na prestigiosa University of Southern California (USC), nos EUA.

Apesar de terem suas diferenças, os dois acabaram se unindo e formando uma amizade duradoura graças ao amor por jogos eletrônicos, particularmente experiências multiplayer como StarCraft e Everquest.

O caminho até a formação do que viria a ser a Riot Games não foi exato e rápido, já que inicialmente os dois seguiram seus caminhos profissionais na indústria financeira, com Beck trabalhando para a empresa Bain & Company e Merrill arranjando um emprego no U.S. Bank.

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Marc Merrill (e) e Brandon Beck (d), cofundadores da Riot Games

BAFTA/Divulgação

A paixão pelos games, porém, levou os dois a pensarem em alternativas.

"Nós morávamos juntos em um pequeno apartamento em West Hollywood", disse Beck em entrevista ao site Polygon. "Foi lá na verdade que a Riot meio que começou. Você entrava em nosso apartamento e não havia praticamente nenhum móvel em lugar algum, nada nas paredes, quadros que não havíamos pendurado ainda. E dois PCs para jogos enormes em duas mesas que formavam um pequeno L."

"Isso era exatamente o tipo de coisa que gostávamos de fazer juntos na época."

A dupla, porém, não se limitava apenas a jogar estes jogos, como também participavam ativamente de suas comunidades em fóruns de discussão, defendendo ou criticando games e decisões dos desenvolvedores.

Dentre estas críticas, Merrill e Beck tinham uma reclamação principal: muitos destes jogos, por mais adorados que fossem, eram inevitavelmente abandonados, deixando a comunidade órfã.

"Nós éramos aqueles jogadores que estavam dispostos a gastar mil horas jogando seu game se havia uma experiência competitiva engajante", explicou Beck ao site Inc. "Mas muitas vezes nos sentíamos ignorados."

Foi assim que surgiu a ideia de criar um próprio estúdio, que se dedicaria não só a desenvolver um game, como fazê-lo crescer e evoluir constantemente, sem abandoná-lo após um período específico de tempo.

Encontro de destinos

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LoL tem suas raízes (e equipe de desenvolvimento) no mod DotA All-Stars

kunkka/DeviantArt

Apesar de um tanto receosos quanto aos novos planos da dupla, em 2006 familiares e investidores-anjo arrecadaram US$ 1,5 milhão para ajudar os dois a fundarem seu próprio estúdio de jogos, a Riot Games.

Sua primeira contratação já indicava os caminhos para os quais os dois queriam tomar, contratando Steve "Guinsoo" Feak, uma das principais mentes por trás de um dos grandes fenômenos de PC da época: o popular mod de Warcraft III, DotA Allstars.

Feak, ao lado de outros membros da comunidade de DotA, foram os primeiros funcionários da Riot, e começaram imediatamente a trabalhar em seu primeiro game, que utilizaria os sistemas criados para o popular mod para um jogo próprio.

Assim surgiu o precursor de League of Legends, Onslaught.

"Era terrível", explicou Merrill ao Polygon. "Tínhamos uma trilha sonora de metal. Os minions eram pequenas coisas mortas-vivas na época. Passamos por um monte de iterações, e era simplesmente ruim."

Nicolo Laurent, atual CEO da Riot e na época representante de uma publisher europeia, também não mede palavras ao falar desta versão inicial.

"Brandon dizia: 'Nicolo, veja isso. Eu tenho um vídeo de nosso protótipo. Fizemos em apenas quatro meses.'", relembra ao Inc. "Ele estava tão orgulhoso. E era tão triste, porque parecia terrível."

Mas, terrível ou não, Beck e Merrill levaram Onslaught até a Game Developers Conference 2007 em São Francisco, nos EUA, para discutir a possibilidade de parcerias com publishers e financiadores interessados.

Estas discussões, porém, revelaram algo importante para a dupla.

"Originalmente, planejávamos ser apenas uma desenvolvedora de games", explicou Merrill. "Não tínhamos planos de de construir um negócio inteiro de distribuição. Ao começar a encontrar com as publishers, percebemos: 'Nossa, não podemos dar as chaves ao reino para estes caras.'"

De acordo com os cofundadores, as publishers americanas não se mostravam dispostas a adotar o modelo que a Riot queria para seu game, que poderia ser jogador gratuitamente, e financiado via compra de elementos extras por microtransações.

O sistema, porém, chamou atenção tanto de empresas de capital de risco, como a FirstMark Capital e Benchmark Capital, quanto a gigante Tencent, que ofereceu sua distribuição no mercado chinês, e que viria no futuro a adquirir a empresa.

Em 2008, a Riot Games conseguiu o capital extra de US$ 7 milhões para desenvolver o seu jogo, e na época Beck, então CEO da companhia, deu pistas sobre no que estavam trabalhando, em que buscavam servir.

"Há um apetite fundamental por aí para experiências de jogo online que não são seu típico 'jogo casual'", disse em entrevista ao Kotaku. "Que é mais rico que sua típica experiência casual mas não tão profunda ou que leve tanto tempo quanto algum MMO de primeira linha que chamem a atenção do gamer hardcore ou midcore."

Ainda em 2008, a Riot finalmente revelou o que haviam planejado para saciar este apetite: League of Legends: Clash of Fates.

Entre o pré-alfa e o lançamento oficial do game, em outubro de 2009, a equipe acabou removendo o subtítulo, já que o plano inicial era de criar novos a cada grande atualização - e que também serviriam de trocadilhos infames, como League of Legends: Wizards, Thieves, Fighters (ou LoL: WTF).

"Estávamos tentando ser espertos, e não era bom", disse Merrill. "Daí dissemos: 'isso é estúpido. Vamos acabar evoluindo o jogo sempre, então quem se importa?"

Colocando o "S" Riot Games

Desde 2009, a Riot só tem um jogo lançado oficialmente em seu portfólio.

E, para ser justo, são poucos os jogos que atingiram o mesmo patamar de popularidade que League of Legends, tanto o jogo em si quanto seu enorme setor de esports - que, como apontado por Marc Merrill, é totalmente controlado pela companhia.

"Imagine que inventamos o basquete, mas somos donos de todas as quadras no planeta, vendemos os tênis, e montamos a NBA", se vangloria o cofundador ao Inc.

Ainda assim, até entre fãs popularizou-se a piada de que o nome ideal para a empresa seria "Riot Game".

Em 2016, porém, Beck chegou a dizer que um dos objetivos futuros da empresa é "colocar o 's' em Riot Games".

E, a julgar por planos como o jogo de luta anunciado no EVO 2019, as chances são grandes de que a empresa honre seu próprio nome, mas ainda mantendo a mentalidade e estrutura do que tornou LoL tão popular.

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Riot Games/Divulgação