Não sei nem por onde começar. Final Fantasy XVI é um daqueles jogos em que você pode se apaixonar por alguns elementos e, simplesmente, detestar outros aspectos da experiência igualmente. É nítido que a Square Enix, como de costume, investiu bastante na história, mas faltou organizar tudo de uma maneira que tornasse a jornada por Valisthea mais consistente.
Um novo estilo de jogabilidade
Ao contrário dos jogos anteriores da franquia, como Final Fantasy VII Remake ou o não tão saudoso Final Fantasy XV, Final Fantasy XVI é um RPG de ação que envolve esmagar botões frequentemente em vez de tomar decisões pontuais por meio de menus em meio à batalha, como é o caso na recriação do sétimo jogo da série.
O choque de realidade será considerável para fãs de longa data. Em muitos momentos, a sensação será de que você está, sim, jogando algo mais parecido com Devil May Cry do que com qualquer outro Final Fantasy. E, se você esperava que eu fosse dizer que isso funciona, sinto lhe informar que passou longe de ser o meu caso.
Todo o combate de Final Fantasy XVI gira em torno de combos que consistem em apertar quadrado várias vezes, ativar algum comando para se aproximar do inimigo ou trazê-lo de volta até você e usar um golpe especial proveniente de algum dos Eikons aos quais Clive possui acesso.
Há um problema aí: durante grande parte do jogo, Clive só pode alternar entre dois Eikons, e, quando finalmente chega a hora de aproveitar os demais, a história já avançou consideravelmente — e você perdeu horas apertando quadrado e vendo exatamente os mesmos golpes.
Se, por um lado, os ataques mais poderosos trazem animações incríveis que preenchem a tela com cores e efeitos impressionantes, por outro, as lutas em si são entediantes. Ao mesmo tempo em que os inimigos não oferecem qualquer desafio, todos possuem barras de saúde que demoram mais do que deveriam para diminuir — principalmente, no caso dos chefes.
É nítido que os desenvolvedores da Square Enix não souberam como tornar as lutas contra chefes minimamente desafiadoras. Então, para esconder o fato de que esses adversários são limitados, a empresa recorreu ao seguinte: tornar a barra de saúde desses chefes maior do que o necessário para passar a ilusão de desafio.
Durante os combates, há tanto uma barra de saúde quanto uma barra de postura para os inimigos mais poderosos. Ao quebrar a postura dos chefes, por exemplo, eles ficam expostos por mais tempo e podem sofrer ataques sem reagir. Nesses momentos, você deve infligir o máximo de dano que puder para acabar com a luta o mais rápido possível. Caso contrário, você se verá preso em uma longa repetição de esquivas fáceis, golpes repetitivos e sonolência constante.
Até mesmo no que diz respeito à estrutura das dungeons, se é que posso chamar assim, o gameplay é extremamente repetitivo. Andamos um pouco. Lutamos contra inimigos obrigatórios. Andamos mais um pouco. Lutamos contra mais dos mesmos inimigos com algumas poucas variações. Andamos de novo. Encontramos algum inimigo com uma barra de saúde maior. Finalmente, chegamos a um chefe que tem uma enorme barra de saúde — apenas para que possamos passar mais tempo batendo nele e usando as habilidades legais de Clive.
Chega a ser frustrante, porque os golpes criados para Clive Rosfield são realmente muito bonitos. A vontade é comprar e dominar cada um deles para usar em combate. No entanto, a plasticidade dos movimentos não torna mais tolerável a simplicidade excessiva das lutas. Por mais bonito que fosse ver um tornado gigante erguer meus inimigos enquanto eu invocava um raio para acabar com todos eles em pleno ar ou os queimava com uma explosão de fogo, sempre que chegava a hora de brigar contra um chefão, o sentimento era de preguiça, por saber que seria apenas uma longa repetição dos mesmos combos que eu já havia realizado.
Não tenho como saber se estou sozinho quando digo que uma evolução do modelo apresentado em Final Fantasy VII Remake seria uma escolha melhor do que uma adaptação do sistema de combate que vemos em Devil May Cry. De qualquer forma, foi exatamente isso que senti. A direção a ser seguida era a da recriação do sétimo jogo. Esse hack and slash com elementos de RPG que foi apresentado em Final Fantasy XVI pode até enganar, já que o visual, às vezes, impressiona, mas passa longe de ser algo realmente engajante.
O mesmo se aplica aos combates entre Eikons. Se, por um lado, as criaturas que podem ser invocadas pelos Dominantes estão lindas, por outro, os minutos desperdiçados em combos repetitivos contra chefes burros são uma tristeza. Aliás, o sentimento de frustração só é realçado pelos Quick Time Events, que, em muitos casos, são absolutamente dispensáveis.
Talvez eu relevasse a nítida aversão que desenvolvi em relação ao sistema de combate se, pelo menos, as missões fossem mais instigantes. Mas, não, isso passou longe de ser o caso.
Estrutura e história
Final Fantasy XVI é um jogo dividido em grandes ambientes que podem ser explorados individualmente em vez de como partes de um todo. Ou seja, não é um jogo de mundo aberto, no qual podemos ir de norte a sul sem interrupções ou telas de carregamento. Ainda assim, o mapa tenta simular uma continuidade entre os ambientes apresentados.
Do ponto de vista artístico, Valisthea é um mundo coeso. Ainda que as regiões sejam divididas, há nítida preocupação com situar os jogadores a respeito das diferenças entre os territórios que compõem o Grão-Ducado de Rosária, o Sacro-Império de Sanbreque e a República de Dhalmekia, por exemplo.
Bom, isso se aplica, na verdade, aos casos em que existem sinais de civilização. Durante a maior parte do tempo, Clive apenas anda em linha reta por grandes corredores cercados por árvores ou em vastas planícies desérticas sem qualquer característica especial. Há bastante repetição nas paisagens que existem fora dos limites dos territórios ocupados, infelizmente.
O principal incentivo dos jogadores para navegar entre os ambientes apresentados são, evidentemente, as missões, que podem ser divididas entre primárias, secundárias e caçadas — a estrutura padrão de, basicamente, todos os RPGs de ação dos últimos 10 anos, pelo menos.
Nos casos em que jogadores precisam dar continuidade à história, ou seja, nas missões principais, a sensação de avançar é prazerosa. Afinal, apesar dos combates repetitivos, vemos o desenrolar da jornada de Clive e também uma série de revelações e reviravoltas relacionadas ao contexto político de Valisthea, que é mais complexo do que você pode imaginar — e foi, nitidamente, inspirado em Game of Thrones.
Há muitas cenas cinematográficas longas que trazem contexto para a história e mostram o que está acontecendo em diferentes núcleos. Houve casos em que cheguei a passar mais de 10 minutos sem encostar no controle e apenas pude assistir ao que os personagens estavam fazendo, por exemplo. E, honestamente, eu adorei esses momentos. Ironicamente, gostei mais de assistir às cenas em CG do que de jogar, de fato.
Essa pode não ser a história mais emocionante da franquia Final Fantasy, mas há, sim, alguns momentos de drama convincentes e uma discussão onipresente ao longo da narrativa que inspira os jogadores a lutar por um mundo melhor em Valisthea. Clive, Joshua, Jill e, principalmente, Cid são nomes que ficarão registrados em minha memória para sempre, sem sombra de dúvidas.
Um novo recurso de FFXVI, que merece ser adicionado a todos os jogos da franquia Final Fantasy, traz até arquivos de texto com informações detalhadas sobre todos os personagens, dos mais importantes aos mais irrelevantes, além de contexto sobre o complexo mundo no qual estamos inseridos. Esse é, com certeza, o Final Fantasy com o mundo mais complexo já visto nos jogos single-player da série (é difícil competir com algo como Final Fantasy XIV, que conta com uma década de atualizações e novos conteúdos sendo lançados).
Levando em consideração toda essa preocupação com construir uma realidade cativante e complexa, era de se esperar que as missões secundárias fossem bem estruturadas. Certo? Bom, infelizmente, essa conclusão não poderia estar mais distante da realidade.
Com exceção de duas missões secundárias específicas, que mostraram o sofrimento ao qual uma parcela da população de Valisthea estava condenada, todas as demais atividades opcionais do jogo se encaixam no conceito de "fetch quests", que são missões vazias nas quais temos de obter itens para alguém. É um horror pensar que, depois do fracasso das missões secundárias de Final Fantasy XV, a Square Enix repetiria o mesmo erro com Final Fantasy XVI.
Se há algo que torna esse tão estranho Final Fantasy XVI mais impactante e tolerável é a música. A trilha sonora é absolutamente impecável, com destaque para as faixas mais calmas que podemos deixar tocando em loop no esconderijo. Nesse departamento, assim como na história, Final Fantasy raramente erra — e, felizmente, a máxima continua valendo para Final Fantasy XVI.
Desempenho e visual
Muitos fãs questionaram a Square Enix, ao longo dos últimos meses, a respeito da exclusividade de Final Fantasy XVI para o PS5. Em diferentes momentos, representantes da empresa defenderam que, ao focar em uma única plataforma, o trabalho ficava mais fácil e eficiente.
Infelizmente, entretanto, o PS5 não roda Final Fantasy XVI tão bem assim. Seja na opção de priorizar a taxa de quadros ou na opção de priorizar a qualidade gráfica, Final Fantasy XVI é bastante instável. Principalmente, como já poderia se esperar, quando há elementos demais em tela.
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Curiosamente, até mesmo em simples caminhadas pelo esconderijo de Clive, jogadores podem enfrentar quedas na taxa de quadros, mesmo que pouquíssimos elementos estejam disponíveis no horizonte. Talvez o patch de primeiro dia resolva uma parte desses problemas, mas não há como garantir. Na versão de análise, não faltaram quedas de taxa de quadros.
Na verdade, mesmo ignorando problemas de performance, devemos ressaltar algo aqui: há uma alternância constante entre CGs e diálogos que ocorrem com os modelos de personagem in-game. Nos casos das cenas em CG, todos os personagens são lindos, assim como os efeitos de iluminação e os cenários. Agora, nos diálogos que acontecem entre modelos de personagem in-game, parece que todos estão mortos por dentro.
Recomendamos?
Se você é um fã de longa data da franquia Final Fantasy, recomendo que jogue FFXVI pela curiosidade. Há uma chocante mudança de ritmo e jogabilidade em relação aos anteriores, mas vai depender de você se essa reformulação foi para o bem ou para o mal. Aos que não estão familiarizados com a série, esse é um jogo tão bom quanto qualquer outro para começar. Contudo, jogue ciente de que o auge da franquia está muito acima do que é Final Fantasy XVI.
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- Lançamento
22.06.2023
- Publicadora
Square Enix
- Desenvolvedora
Square Enix
- Censura
16 anos
- Gênero
RPG/Ação
- Testado em
PlayStation 5