Bastou um trailer para que Need for Speed: Payback fosse comparado diretamente a Velozes e Furiosos. É um paralelo fácil e justo de se traçar, já que o jogo nutre uma história de amor e ódio com o filme por boa parte de seus 20 anos de existência.

Aí, nos primeiros cinco minutos de Payback, passa um carro voando no meio da tela. É, a comparação realmente faz sentido.

É muito claro no que a Ghost Games e a EA miram. Velozes conseguiu se reinventar de série de filmes de corridas de rua para uma série de filmes de ação espalhafatosos e Need, que brilhou ao se aproximar de Toretto e cia. na consagrada fase Underground, vai tentar o mesmo truque pela segunda vez. Só que, desta vez, é mais difícil repetir o feito.

Need for Speed: Payback tenta refletir essa sensação de grandiosidade das aventuras mais recentes de Velozes com missões cinematográficas, intercalando perseguições e segmentos com diferentes personagens (e carros) com cenas altamente roteirizadas: é uma jogada de câmera passando do veículo A para o B aqui, um salto do carro C na direção oposta ali, e por aí vai.

O novo NFS mira em Velozes, mas mal passa a sensação de adrenalina dos filmes

Mas o novo NFS mal consegue passar essa sensação de forma satisfatória. Fora alguns lampejos de criatividade - como em um segmento no qual você deve escapar de um helicóptero equipado com tecnologia que pode desligar, remotamente, o seu carro -, o resto é um tedioso sem-fim de perseguições ou corridas do ponto A ao B no qual os segmentos cinematográficos pouco importam no gameplay.

Uma cidade de farsas

Estes momentos são salpicados - com muita parcimônia, diga-se de passagem -, em extensas baterias de grinds para justificar alguma progressão dentro da história. Ao melhor estilo "família", Payback conta a história de um grupo que é traído por uma de suas integrantes, que se revela ser integrante da Casa, a organização que comanda o crime do Vale Fortune (a Las Vegas fictícia do jogo).

Need for Speed Payback

Lina, a vilã de NFS Payback, é quem mais dá as caras ao lado do protagonista Tyler

EA/Divulgação

Para dar o troco, o grupo passa a reconstruir sua reputação derrotando diversas facções de corrida ao redor do Vale Fortune. Cada uma, convenientemente, representa um dos tipos de disputas dentro do jogo: há corridas convencionais, off-road, de arrancada, de drifts - a facção desta aqui, bizarramente, acredita em se erguer contra o poder corporativo por meio das derrapagens de carros. O único tipo de corrida que foge do padrão são as de fuga, que intercalam boas perseguições com missões nas quais você basicamente vira um Uber, levando gente de um lado a outro no menor tempo.

Enquanto a narrativa é pobre, tanto nos diálogos quanto nas sequências visuais (é impressionante o quão pouco os personagens aparecem fora de seus carros para economizar recursos de produção), a jogabilidade segue o padrão de um jogo de corrida mais casual, sem oferecer muitos desafios. Em menos de cinco corridas você consegue pegar o feeling de todos os carros em qualquer tipo de corrida, com padrões bem claros de aceleração, frenagem e curvas. Como esperado.

O "desafio" imposto pelo jogo fica em algo alheio a sua habilidade como piloto. Seguindo uma tendência de The Crew e dos Forza, NFS Payback regula seus carros por meio de níveis, e a exigência de níveis aumenta exponencialmente a cada missão. O jogo espera, então, que você melhore o nível de seus bólidos com frequência.

Need for Speed Payback

As cenas cinematográficas não compensam o grind excessivo e a economia duvidosa

EA/Divulgação

Para fazer isso, você pode equipar cartas de melhora em partes específicas do carro - freios, bloco, nitro, entre outras -, cada uma com nível e habilidades específicas. Entretanto, cada parte é trancada em um carro, o que significa que, se você comprar um carro melhor, você não poderá levar seus upgrades do automóvel antigo. Sendo assim, a cada nova adição à sua coleção, também é necessário repetir o processo de melhorar o veículo para que ele fique competitivo.

Existem algumas maneiras de conseguir melhorias: completando missões (que podem ser jogadas quantas vezes você quiser), e conseguindo uma carta aleatória a cada vitória. Outra é ir à loja de peças, cujo estoque é aleatório e é renovado a cada 10 minutos. Se você não achar o que quer, terá de aguardar novos itens.

Rodando, rodando, rodando

As outras duas alternativas de conseguir melhorias estão na aquisição de loot boxes ou em um menu no qual você literalmente gira uma roleta e consegue a parte aleatoriamente (você pode fixar qual peça quer ou qual marca - equipar peças de uma mesma marca rende bônus no seu nível). Para girar essa roleta, é necessário adquirir uma moeda que vem nas loot boxes, ou ao trocar a carta que você recebe ao ganhar uma corrida.

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No fundo, é uma tática para te encorajar a gastar dinheiro de verdade, já que você precisa dar muitas voltas (no sentido literal e figurativo) para conseguir o que realmente precisa.

A sensação é a de que o jogo está armando para cima de você

Caixas de loot têm sido um ponto controverso na economia dos jogos em 2017 (Terra-média: Sombras de Mordor, da WB Games, e Star Wars: Battlefront II, também da EA, que o digam), e, apesar de dar sinais claros de que a conta de produção dos jogos não fecha, é simplesmente desonesto atrelar esse tipo de monetização ao sistema de progressão de um jogo pelo qual já se pagou um preço fixo (US$ 60 nos EUA e mais de R$ 200 no Brasil, em média).

Esse tipo de tática acaba eclipsando qualquer outro tipo de qualidade que o jogo venha a ter. O grind excessivo e absurdamente atrelado à sorte (ou ao dinheiro de verdade) não vale a jogabilidade agradável, as poucas missões cinematográficas nem o mundo aberto que Need for Speed: Payback proporciona. Ironicamente, o novo título da franquia te coloca contra uma organização criminosa que arma corridas, mas a sensação que o jogo deixa de verdade é a de que estão armando para cima de você.

Need for Speed: Payback está disponível para PlayStation 4, Xbox One e PC (Origin). O jogo foi testado em um PlayStation 4 padrão. Clique no nome da plataforma para conferir seu preço nas versões digitais.

Nota do crítico