O novo God of War começa com Kratos olhando para uma árvore.

Você aperta R1 e Kratos golpeia a árvore com o machado mágico Leviathan. Você aperta R1 novamente. Kratos dá outra machadada na madeira, o semblante sério, a face enrugada.

Mais um aperto de R1. Kratos acerta a árvore novamente, com mais vigor, mais raiva. Como se estivesse espancando os ciclopes ou as quimeras da mitologia grega. Por fim, em um R1 derradeiro, o machado de Kratos atravessa o que restou do tronco, levando-o ao chão.

Este é o pontapé da nova aventura do espartano, que chega ao PlayStation 4 em 20 de abril. Tivemos a oportunidade de jogar as primeiras horas do game, e este tipo de interação, tão comum aos outros títulos da franquia, não aconteceu em mais nenhum outro momento - e, para ser sincero, eu duvido que aconteça no restante do jogo.

Eu confesso que não esperava essa familiaridade ao entrar em contato com o game. Afinal, tudo o que foi divulgado dele, desde a sua surpreendente apresentação na E3 de 2016, indicava um distanciamento da pegada violenta e brutal que definiu os últimos seis jogos da saga (nem tentem me convencer a levar em conta o título mobile).

Divulgação/Sony

Esse distanciamento existe, de fato. Quando começamos o jogo, acompanhamos um Kratos aparentemente mais maduro e controlado, capaz de segurar a raiva para ensinar o filho, Atreus, o melhor momento para atirar a flecha na hora de caçar.

Entretanto, momentos depois, este é o mesmo Kratos que arranca com brutalidade a cabeça de um draugr ou espanca os inimigos durante o modo Spartan Rage (mantendo a tradição da série de dar ao espartano uma mecânica que aumenta o poder durante um período limitado). O resultado é um jogo que, à primeira vista, parece muito diferente, mas a todo momento parece quebrar a nova aparência para retomar seu instinto selvagem.

A primeira cena, entre Kratos e a árvore, torna-se banal diante do que acontece depois (e que não vamos comentar neste texto para não estragar a surpresa), mas no fundo é uma mensagem de como será o tom da mais nova aventura de um dos ícones do PlayStation. Assim como o próprio Kratos, o jogo parece estar em constante conflito com a exigência de honrar o próprio legado e a necessidade de inovar.

Na sessão de testes, realizada nos próprios estúdios da Sony Santa Monica, nos Estados Unidos, a equipe de desenvolvimento olhava com atenção. O conflito interno de Kratos e do próprio jogo é, também, compartilhado pelo time. "Equilibrar o tom clássico com o novo foi um dos nossos maiores desafios durante todo o processo de produção", conta ao The Enemy o diretor Cory Barlog.

Uma nova dinâmica

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O novo God of War se passa inteiro em um plano-sequência. A câmera, agora sob o controle do jogador nas partes de gameplay, não terá cortes, fazendo transições de seu posicionamento normal para tomadas mais dinâmicas em alguns momentos. Só essa mudança já enorme, ao considerarmos que a câmera sempre foi fixa nos jogos da franquia, mas se torna ainda mais impactante com o controle nas mãos.

Ter a câmera mais próxima de Kratos significa, por exemplo, que você não poderá ver sempre quem está ao seu redor. Isso altera dois grandes pilares de God of War: o combate, que tem uma dinâmica completamente diferente, e os puzzles, que ganham novas possibilidades (falaremos mais sobre ambos adiante).

A maior mudança, entretanto, se dá na presença de Atreus durante toda a jornada. Toda a divulgação de God of War têm focado em uma história mais humana e isso se deve exclusivamente ao relacionamento que ele precisa desenvolver com o filho no decorrer do jogo.

É algo mais próximo das experiências de vida do próprio Barlog, que claramente influencia todos os aspectos da aventura - e, de certa forma, mais parecida com o estilo que os jogos da Naughty Dog viriam a definir como o pedigree de um jogo exclusivo do PlayStation nos últimos anos (as comparações entre os dois estúdios são e serão inevitáveis).

A dinâmica entre os dois também é parecida. Kratos e Atreus conversam o tempo todo (ou melhor, Atreus fala e Kratos reage), até mesmo durante o gameplay, e o espartano pode dar ordens ao filho com um botão. A princípio, isso é mais ligado ao combate, já que o botão serve para o garoto disparar flechas e atrair a atenção de inimigos. Porém, seu uso também é ligado o andamento da trama em si.

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Em um determinado momento no começo da aventura, Atreus acaba de passar por uma experiência traumática. Ao mesmo tempo, o garoto precisa jogar uma corrente para que o pai consiga subir até a saída de um calabouço. O garoto anda vagaroso, apático, e o quadrado serve para Kratos tentar conversar (à maneira truculenta dele, claro), sobre o que aconteceu.

Desde o começo, fica bem claro que há um estranhamento entre Kratos e Atreus. Os dois nunca tiveram um relacionamento de pai e filho e a convivência deles parece mais fruto de acontecimentos externos do que a vontade de estarem juntos. Entretanto, o pai vê no filho a mesma índole sanguinolenta que o levou às maiores tragédias de sua vida. Ele precisa ensinar o menino a controlar a raiva, ao mesmo tempo que mal consegue lidar com os próprios sentimentos.

Divulgação/Sony

Esses interessantíssimos dilemas que moldam a aventura desde o começo - a relação de Kratos e Atreus, a relação de Kratos com sua própria natureza -, vêm da vivência de Barlog com seu próprio filho. "Minha raiva pessoal é ter uma natureza obsessiva de controlar, um equilíbrio terrível entre vida pessoal e trabalho", diz o diretor.

"Esses são os meus demônios internos, e não quero que meu filho seja assim. Agora que ele está crescendo, vejo essas mesmas características se manifestarem nele, essa inabilidade de deixar as coisas de lado, e me parte o coração. Como posso ensiná-lo a não fazer essas coisas quando nem eu mesmo consigo me controlar?", pondera.

O que muda nas lutas

Se o jeito de contar a história é bem parecido com o estilo da Naughty Dog, o jeito de jogar é completamente diferente. O combate será, talvez, o elemento mais familiar de God of War a quem conhece e gosta dos jogos anteriores da saga, ainda que ele seja completamente diferente.

A maior mudança se dá na troca de arma de Kratos. Sem as lâminas acorrentadas ao braço, Kratos não tem mais a mesma facilidade de acertar diversos inimigos ao mesmo tempo, o que exige do jogador mais cautela e estratégia na hora de lutar contra grupos.

O machado pode ser arremessado e chamado de volta a qualquer momento, e alguns inimigos são congelados ao serem acertados. Isso permite, por exemplo, que Kratos paralise um oponente enquanto cuida dos outros. Atreus também faz diferença nessas horas. Ele pode atirar flechas e chamar a atenção dos inimigos caso Kratos esteja cercado.

Embora esteja com um machado, Kratos continua tão brutal quanto nos jogos anteriores, o que rende diversas finalizações nas quais ele decepa os oponentes ou os estraçalha ao meio.

Seguindo a tradição de God of War, tanto Kratos quanto Atreus podem aprender novas habilidades, e a lista do que está disponível é bem maior e mais complexa do que nos outros jogos da franquia. As habilidades são adquiridas com pontos de experiência, mas também podem vir de runas que podem ser equipadas no machado.

Os equipamentos de ambos também podem ser melhorados, o que abre mais espaço para equipar runas ou, no caso de Atreus, ativa habilidades passivas, como buscar itens de cura para Kratos.

Estas runas geralmente se encontram em baús, e muitos deles são protegidos por encantamentos. Vários estão no começo da aventura e não podem ser abertos, indicando que o jogo terá bastante backtracking (o ato de retornar a um ponto que você já passou) para conseguir essas habilidades.