Review: Persona 5 Royal

Abram alas para a realeza dos JRPGs

Por Jessica Pinheiro 26.05.2020 11H00

Persona 5 é um jogo excelente. Desde seu lançamento ocidental, em 4 de abril de 2017, você já deve ter lido sobre como os gráficos e o estilo visual do jogo são extremamente bonitos e fogem à regra de maneira absolutamente estilosa, sobre como a trilha sonora regrada a jazz fusion é fenomenal e as músicas combinam perfeitamente com todos os momentos em que tocam, e sobre como os personagens são (em sua grande maioria) carismáticos e o enredo é minuciosamente desenvolvido ao redor deles.

Sobre como o game traz à tona ambientes e temáticas realistas pautadas em estruturas sociais e morais da atualidade, sobre como os conceitos psicológicos e esotéricos são profundos e eximiamente utilizados para construir todo o sistema de gameplay, e sobre como as mecânicas conversam umas com as outras trazendo um perfeito equilíbrio entre seus subgêneros - mais do que qualquer outro jogo da série. Tudo isso é Persona 5, de forma bem resumida.

É um jogo especial e impactante; diferente, bonito, complexo e agradável ao ponto de que você não vai notar as horas passando ao jogá-lo e, quando perceber, provavelmente chegará em 100 horas de jogatina ou mais, fácil. 

Dadas as breves explicações, acredito que não preciso me estender e aprofundar os conceitos técnicos ou subjetivos de Persona 5, até porque, o The Enemy já conta com um review do título lançado no Japão em setembro de 2016 e, no restante do mundo, seis meses depois. Ainda assim, caso você esteja lendo este texto sobre a nova versão do game e nunca jogou ou não sabe muito bem do que se trata, ainda, leia a análise do jogo original.

Aqui, é a hora da realeza brilhar: esta crítica tem como objetivo explicar o que Persona 5 Royal trouxe de melhor e se obteve êxito nessas mudanças; e principalmente se vale a pena ou não investir seu tempo e seu dinheiro nesta nova versão de Persona 5, seja você um jogador novo ou antigo.

Degustação majestosa

De forma geral foram feitas diversas melhorias gráficas em P5R: as cores estão mais vibrantes e há mais detalhes nos cenários, além de os personagens estarem mais polidos. Existe um novo menu e uma nova animação de abertura, novas artes nas telas de loadings e também uma nova fonte nas caixas de diálogos.

Os personagens ganharam novos retratos, expressões e diálogos, e o game conta com novos efeitos visuais. A localização de P5 foi novamente revisada, corrigindo alguns erros; e o jogo conta com uma nova e diferente lista de troféus. Foram adicionadas ainda cerca de 30 novas músicas à trilha sonora.

Essas melhorias técnicas, claro, existem porque P5R é exclusivo para PlayStation 4. Quando P5 foi anunciado oficialmente em 2013, a previsão na época era de que o game fosse lançado apenas no PlayStation 3 e, mais tarde, com os adiamentos e problemas na produção que foram surgindo eventualmente, a Atlus anunciou que o jogo também ganharia uma versão para o atual console da Sony

A nova versão do título, portanto, não precisa mais se preocupar em cortar ou conter conteúdo, já que o PS4 consegue suportar o desempenho de P5R com tudo o que o jogo tem a oferecer. Ainda assim, é preciso ressaltar como P5 já era um título muito agradável de se jogar e o novo game conseguiu deixar esse aspecto ainda melhor, melhorando o ritmo da jogatina com pequenas alterações que, quando observadas de um espectro geral, mudaram sua totalidade para melhor.

Para bem ou para mal, P5R está muito mais fácil também. Como alguém que já havia jogado P5 na época de seu lançamento, as mudanças na fluidez do gameplay foram extremamente agradáveis, pois, deixaram tudo que eu conhecia ainda mais funcional - irei explicar melhor mais adiante.

De toda forma, para um jogador de primeira viagem, isto é, alguém que nunca teve contato com Persona antes e quer começar por este jogo, a experiência de gameplay será como a de começar uma degustação pela última e melhor sobremesa do menu, com os demais jogos da série sendo sobremesas gostosas também, mas não tão saborosas quanto P5R.

O que faz essa sobremesa tão gostosa é a complexidade, porém, coerência de velhos e novos ingredientes que, quando misturados, entregam um sabor mais refinado, e que certamente vai deixar o paladar de muitos jogadores mais exigente daqui para frente. E para quem provou P5 no passado, experimentar essa nova versão será como revisitar um restaurante favorito, só que sob uma nova e mais requintada (mas não menos respeitável) direção.

Atlus/Reprodução

Diamantes mais polidos (e brilhantes)

Agora, resta falar o que P5R traz especificamente de novo e se conseguiu ser bem-sucedido nessas alterações. Dito isto, daqui em diante, o review fará mais sentido para quem já jogou P5. Caso você queira saber mais sobre o novo “quarto trimestre” do game, pode pular para a antepenúltima parte da análise (A verdadeira joia da coroa), ou continuar a  leitura e agu “quarto trimestre”ardar que daqui a pouco chegaremos lá.

De toda forma, aproveitando o gancho sobre o gameplay retratado no tópico anterior, P5R fez um ótimo trabalho ajustando e equilibrando melhor a jogabilidade, o que se aplica não apenas às mecânicas do dia a dia do Protagonista, como também aos combates no Metaverse, quando o personagem e seu time assumem seus alter-egos de Phantom Thieves of Hearts.

Nas batalhas, por exemplo, a munição das armas não era recarregada até a próxima visita a um dungeon, ou seja, era a mesma quantidade do início ao fim da exploração, o que significava que o jogador tinha que escolher muito bem quando ia utilizar esse recurso, pois os tiros podiam se acabar logo na primeira batalha; tornando assim as armas inutilizáveis em pouco tempo.

Agora, a munição é automaticamente recarregada após cada batalha, o que faz desse recurso muito mais utilizável e muito mais valioso, afinal, muitos inimigos são fracos contra disparos. Além disso, essa alteração aumenta a margem de erros na hora de tentar adivinhar o ponto fraco de um Shadow - os oponentes dentro do Metaverse.

Outro recurso modificado para melhor foi o Baton Pass. Antes, a ferramenta era desbloqueável quando o Protagonista e seus Confidants (jogáveis) atingiam um certo nível de amizade - Rank 2, geralmente. Com essa habilidade, o personagem podia passar seu turno extra para outro membro da equipe, após atingir a fraqueza ou infringir um ataque crítico em um inimigo.

Em P5R, o Baton Pass já está disponível desde o início e o jogador pode subir o nível da habilidade ao chamar seus companheiros para atirar dardos em Kichijoji, uma nova área do mapa da cidade.

Atlus/Reprodução

Ao subir o Baton Pass até o rank máximo, os personagens recuperam HP e SP e, ao passar o turno uma vez para todo mundo da equipe durante a batalha, o último personagem não gastará NADA em seu próximo ataque - nem HP nem SP! Pode parecer pouco, mas essa mudança melhorou muito a vida útil dos combates, bem como a sinergia do grupo que, agora, realmente parece mais unificada.

Outro ponto alterado foi um equilíbrio mais evidente dos status e técnicas dos Personas, sejam estes aliados ou inimigos (Shadows). De maneira geral, está mais fácil causar enfermidades - isto é: confusão, sono, raiva, tontura, lavagem cerebral, dentre outros -, e existem novas habilidades para os demônios.

Além disso, os Personas agora têm Skill Traits (peculiaridades nas habilidades) e esse recurso funciona da seguinte maneira: na hora de realizar fusões na Velvet Room e assim, criar novos demônios, o jogador pode escolher qual será o principal traço do monstro, o que vai desde “reduzir pela metade o custo de SP de magias de gelo” até “desbloquear habilidades que só estão disponíveis quando os personagens estão cercados”, dentre outros.

Por falar nos Personas, a negociação com os demônios encontrados no Metaverse está melhor também. Isso porque um dos membros da equipe agora fala qual é o humor do monstro com o qual o Protagonista está tentando negociar durante um Hold Up. Isso facilita muito na hora de o jogador saber qual resposta dar ao Persona para conseguir recrutá-lo, afinal, se a criatura está assustada, é preciso ter um pouco mais de cuidado e, se ela está se sentindo mais alegre, pode-se brincar e deixar-se levar pelo humor da situação.

Novas preciosidades

Além das alterações, o game também recebeu novidades como os golpes especiais Showtime, por exemplo, onde algumas duplas da equipe se unem nos combates para causar um ataque poderoso em um inimigo, em meio a excelentes e divertidas animações cheias de referências à cultura pop.

Os ataques Showtime são liberados conforme o jogador avança na história. Além disso, os Palácios foram retrabalhados e ganharam áreas novas. De modo geral, a exploração está melhor e, principalmente, mais dinâmica, pois o Protagonista agora pode usar um gancho para subir em locais altos e, assim, conseguir acesso a novos e valiosos itens.

Atlus/Reprodução

Os Palácios também receberam as Wills Seeds. Quando o jogador encontra cada uma das partes desse cristal, a equipe recupera um pouco de SP. Após juntar os três pedaços, pode-se equipá-lo e ganhar uma habilidade única; ou ainda, transformá-lo em um acessório com a ajuda do garoto José - o qual falarei daqui a pouco.

Ainda sobre os Palácios, existem novos subchefes e as batalhas contra os chefões ganharam novidades: os governantes dos Palácios têm novas formas ou novos ataques e habilidades que condizem melhor com suas personalidades distorcidas. Os Mementos, o dungeon aleatório que representa o cognitivo das massas; por sua vez, também ganhou melhorias.

Apesar de os andares do Mementos estarem maiores, é neste dungeon que o jogador pode encontrar José, um garoto misterioso que está estudando os humanos. Para sua missão ele conta com a ajuda dos Phantom Thieves, pedindo que eles coletem flores espalhadas pelos níveis. O objetivo do menino é usá-las para fazer um suco de flores (?) e assim, compreender melhor os sentimentos e pensamentos das pessoas.

Em termos de gameplay, isso significa que essas flores são trocadas por itens únicos na loja de José. Além disso, também é possível (e recomendado) coletar as Stamps (estampas) que o garoto espalhou pelo Mementos. Esses adesivos em formato de estrela podem ser trocados por alterações no dungeon aleatório.

Isso significa que o jogador pode aumentar a quantidade de dinheiro que os inimigos deixam no Mementos, além de ganhar mais itens em meio às explorações e, claro mais experiência após as batalhas. Esses bônus, ao contrários das flores, não desaparecem quando os Phantom Thieves saem do local.

Ainda sobre os Mementos: o insta-kill de Morgana na forma de van agora permite que o jogador receba toda a experiência, itens e dinheiro que ganharia sem as modificações feitas por José, além de recrutar instantaneamente os Personas de nível baixo. A habilidade é ativada quando o jogador pressiona R2 para acelerar/correr e atropela os inimigos. O mesmo vale para o insta-kill de Ryuji dentro dos Palácios, que agora é uma habilidade ativada opcionalmente quando o jogador segura R2 para acelerar/correr e vai para cima de inimigos mais fracos.

Existem também novas funções para o touch pad do PS4 dentro do Mementos: se o jogador alisar o botão enquanto Morgana estiver em forma de van, poderá ouvir o gato ronronar pelo controle, e se apertar, o bichano fará um som típico de descontentamento.

Há ainda um novo tipo de clima que afeta os Shadows no Mementos durante o “quarto trimestre”, além de novos Requests (missões), novos Personas para serem recrutados (sendo que alguns deles, inclusive, retornam de jogos antigos da série Shin Megami Tensei); e novos tipos de inimigos, como os Disaster Shadow.

Esses oponentes podem ser encontrados tanto em Palácios quanto no Mementos e brilham de uma maneira diferenciada. Ao morrerem, eles explodem e causam dano nos demais oponentes - o que pode ajudar bastante na dinâmica das batalhas e deixá-las mais rápidas e interessantes, já que os Disaster Shadow quase sempre deixam algum item muito bom.

Vale ainda apontar que a Velvet Room, uma espécie de hub onde o jogador pode criar novos Personas; ganhou novas funções também: existem batalhas especiais que oferecem itens interessantes caso o jogador alcance a pontuação necessária e o “Alarm Mode” (modo de alarme) onde é possível realizar fusões com resultados… inesperados. Isso significa que os Personas criados durante esses eventos podem ser muito poderosos, além de ganharem habilidades avançadas logo no início da aventura.

Por fim, mas não menos importante, há também novas armas brancas e armas de fogo e equipamentos em geral; novas animações, cenas e falas (tanto em texto quanto dubladas em japonês e inglês), além de dois novos finais para a história. Esses novos desfechos estão minuciosamente conectados com o novo “quarto trimestre” do calendário do game. E esse novo período, por sua vez, está ligado diretamente aos novos Confidants, Kasumi Yoshizawa, a estudante honorária e ginasta do primeiro ano que é transferida no mesmo período em que o Protagonista, e Takuto Maruki, um psicólogo que começa a aconselhar os personagens principais após o evento com o professor Kamoshida.

Qualidade de vida mais rica

Antes de falar dos novos Confidants e do “quarto trimestre”, vale apontar como o calendário do game está, de forma geral, muito mais otimizado. Isso significa que o jogador tem mais tempo livre para aproveitar com os amigos após a escola, para trabalhar em empregos de meio período, para explorar os Palácios ou Mementos e/ou fazer qualquer outra atividade que ajudará a subir um Social Status, esteja o Protagonista sozinho ou acompanhado.

A mudança mais bem-vinda para melhorar a qualidade de vida do Protagonista (e por tabela, otimizar o tempo do jogador) é o fato de que Morgana já não impede tanto que o personagem central da aventura faça alguma atividade antes de dormir. Em P5, o gato sempre ordenava que o boneco descansasse, mas em P5R, na grande maioria das noites é possível fazer algo, mesmo que seja no quarto ou na cafeteria, Leblanc.

Atlus/Reprodução

Dentro do Leblanc é possível preparar café ou curry, e ambos se transformam em itens de recuperação de SP para usar nos dungeons. Estudar em uma das mesas ou ler livros e revistas no balcão também estão entre as atividades - e existem novas obras para se consumir em P5R. As palavras cruzadas não consomem mais a noite inteira do Protagonista e há novos games para jogar no quarto (após o jogador comprá-los, claro).

E, assim como em P5, é possível treinar para aumentar o HP ou ainda criar ferramentas de infiltração e de combate. Além disso, caso o jogador queira investir seu tempo em assistir filmes, é possível ir até a loja de aluguel de DVDs e pagar pela assinatura especial de 1 ano logo no início do game. Isso eliminará a preocupação de devolver os longas-metragens até uma data específica. Por fim, o icônico site “Tanaka’s Shady Commodities” também retorna em P5R, mas apenas se o jogador consertar o laptop em um ponto mais avançado do game.

Os menus de assistência do game também ganharam novas funções: além de mostrar o que a maioria dos outros jogadores fez naquele dia, eles também indicam qual Confidant e/ou Social Status é o mais indicado para subir no momento. Outra implementação positiva é que ao visualizar o mapa, além de ver as cartas de tarot que sugerem qual Confidant está disponível para sair, o jogador também pode ver quais localidades o ajudarão a subir seus status sociais - ao colocar o cursor sobre a loja de conveniência, por exemplo, o Protagonista se questiona se poderá aumentar seu “Charm” trabalhando meio período por lá, por exemplo.

Existem também novos eventos e feriados marcados no calendário do jogo e os Confidants do seu time de Phantom Thieves ganharam novas cenas e interações entre si e também com o Protagonista. Agora, todos os amigos ligam para o personagem principal após saírem juntos. Essa conversa por telefone é importante porque permite que o jogador ganhe mais pontos de interação, o que por sua vez ajuda a subir mais rapidamente o nível da amizade.

Há ainda uma nova localidade como já mencionado, Kichijoji, com novas lojas e novos itens para vender e comprar, além de novos locais para sair com os Confidants, incluindo o local onde se joga dardos e bilhar. 

Os dardos, como já comentado, ajudam a aumentar o nível de Baton Pass entre os integrantes da equipe, e o bilhar aumenta o dano de ataques críticos e chances de infringir um “Technical” nos oponentes, portanto, é recomendado gastar um tempinho nessa atividade também. Além disso, quem for fã antigo da série Megami Tensei, rapidamente vai reconhecer a música que toca nesse lugar.

Ainda em Kichijoji, há um clube de jazz para sair com os Confidants, que serve para aumentar os atributos dos personagens (tais como HP, força, magia, etc.), e também um templo que ajuda a aumentar permanentemente o SP do Protagonista.

Atlus/Reprodução

New Game+

Por fim, mas não menos importante, existe ainda o Thieves Den em P5R, um lugar que o jogador pode visitar em seu tempo livre ou no menu principal. Funciona como uma espécie de galeria, onde é possível comprar músicas, artes, vídeos e outros itens com as moedas do jogo, que se acumulam após cumprir certos objetivos dentro do game - como, por exemplo, vencer 50 inimigos com uma arma de fogo.

Por conta disso, existem inúmeros objetivos que deixam a experiência um pouco mais difícil, além de aumentar o fator replay - uma vez que a nova lista de troféus de P5R é bem fácil de conquistar. Para se ter uma ideia, é possível conseguir o troféu de platina em uma única jogada, mas os objetivos internos pedem pelo menos um ou dois New Game+.

Além disso, vale chamar a atenção para a quantidade de material dentro do Thieves Den, que vai desde artes promocionais divulgadas em redes sociais apenas até a vídeos em boa qualidade dos shows chamados Persona Live.

Há também uma espécie de Palace Maker dentro do local, onde o jogador insere modelos e réplicas de personagens, criaturas e lugares visitados durante a aventura principal. Quanto mais objetos forem espalhados pelo cenário, mais Confidants vão surgindo no Thieves Den para apreciar as vistas. As conversas entre eles, inclusive, são bem interessantes.

Ainda sobre o New Game+, além de itens e dinheiro, o jogador também leva para o novo save as melhorias no HP e no SP do Protagonista, dentre outros bônus.

Atlus/Reprodução

A verdadeira joia da coroa

Agora que tudo (ou quase tudo) que há de novo foi explorado nesse review, resta falar do novo “quarto trimestre” e dos novos Confidants. Obviamente, tentarei não dar spoilers do que acontece na história, pois acredito que toda a experiência de P5R deve ser experimentada sem conhecimento prévio.

E digo isso porque os novos Confidants, Kasumi e Maruki, são extremamente bem trabalhados. Vale muito a pena engajar em suas histórias e aprofundar a amizade com eles. Ao fazê-lo, o jogador será recompensado com o aguardado “quarto trimestre” do calendário, que é um período inédito - em P5, isso não existia.

Outro ponto importante para se liberar esse conteúdo novo é o Confidant de Akechi. Em P5, a relação com ele se desenvolvia automaticamente conforme se avançava na história. Em P5R, todas as interações com ele foram retrabalhadas e a amizade com ele se tornou opcional.

Pessoalmente falando, eu já gostava muito de Akechi em P5, mas reconhecia que havia muitos problemas em seu desenvolvimento. Em P5R, porém, ele se tornou meu personagem favorito ao lado de Kasumi, Maruki e do próprio Protagonista.

Abrindo um parênteses sobre isso: se comparados com Persona 3 ou Persona 4, o nível de qualidade das histórias de vida dos Confidants de Persona 5 ficam um pouquinho abaixo - em minha opinião. Isso é um pouco paradoxal porque em P5 o jogador aprende novas habilidades conforme aprofunda as relações com os personagens e em P3 e P4 isso não acontecia. Ainda assim, a verossimilhança e a relação com essas histórias eram mais tocantes, pessoalmente falando.

Todavia, as histórias dos novos personagens de Persona 5 Royal estão equiparadas em termos de qualidade com os Social Links dos jogos anteriores, de tão bem executadas que ficaram.

A única exceção é José, pois o garoto não é um Confidant, infelizmente. Ele funciona mais como uma mecânica de gameplay do que como amigo, apesar de existirem momentos muito interessantes com ele, caso o jogador colete todas as estampas espalhadas pelo Mementos.

Atlus/Reprodução

Voltando um pouco para o conteúdo novo, é preciso registrar como todo o arco do “quatro trimestre”, incluindo o compasso moral e ideológico que o jogador confronta, traz uma montanha-russa de emoções, com alguns dos melhores e mais dolorosos momentos e interações de todo o game.

O último e novo Palácio de P5R, inclusive, tem a estética mais bem executada de todo o jogo. O ambiente é extremamente bonito e perfeitamente condizente com seu governante, além de tocar uma música tema que causa o sentimento perfeito no jogador, para o momento: um misto de angústia e melancolia, com mistério e tentação e, acima de tudo, algo belo.

Por sinal, as novas músicas de P5R elevam a qualidade a um patamar ainda maior do que as do game original. “I Believe” funciona como uma espécie de continuação para a icônica “Life Will Change” e causa arrepios só de lembrar; e os temas “Thow Away Your Mask” e o belíssimo encerramento “Our Light” possuem letras profundas e que refletem perfeitamente o que os personagens sentem e pensam.

Além disso, os produtores trouxeram a canção “No More What Ifs...” (dentre outros elementos) diretamente de Persona 5 the Animation para o game. A música funciona como uma espécie de tema para Akechi, tornando o personagem ainda mais especial nesta nova versão do game.

Por falar nisso, as amizades e todos os laços feitos e maximizados em P5R nunca fizeram tanto sentido e o jogador realmente se sentirá recompensado por aprofundar essas relações.

Se em P5 os Phantom Thieves crescem e aprendem como um grupo, na nova versão eles entendem de fato, o que é ser um indivíduo e como podem moldar seus próprios futuros e, por tabela, batalhar por uma sociedade melhor para todos.

O final de P5 passa uma mensagem bonita e o sentimento que fica é o de realização. Em P5R o verdadeiro final é uma preciosidade sem tamanho: apesar de duro e realista, nos lembra de uma forma poderosa que os laços que construímos não desaparecem verdadeiramente, e, mesmo assim, nós é que precisamos lutar pelo nosso próprio futuro - mesmo que isso signifique abrir mão de algumas coisas.

A lição me tocou em um nível bastante pessoal e, para além disso, não consigo não associar essa mensagem à saída do diretor Katsura Hashino que, após pouco mais de uma década cuidando dos jogos da subsérie Persona, e duas décadas dirigindo a franquia Shin Megami Tensei; deixou o P Studio para fundar outro grupo de desenvolvimento interno na Atlus, o Zero Studio; ao lado do artista Shigenori Soejima e o compositor Shoji Meguro - conhecidos como o “trio de ouro” da marca Persona (via Gaming Gamma).

Em sua mensagem de despedida e agradecimento aos fãs ocidentais no PlayStation Blog, o diretor de P5 disse: “Não importa que tipo de projeto eu faça daqui para frente, amo criar RPGs que são tanto comoventes e fáceis de [o jogador] se reconhecer, independente das diferenças culturais”.

Isso porque Hashino está se dedicando a um novo RPG ambientado em um mundo de fantasia, deixando para trás os aspectos mundanos, realistas, modernos e sombrios da franquia Persona.

Contudo, ainda que esteja seguindo em frente ao lado de seus velhos colegas de trabalho, ele ainda almeja algo tão semelhante e impactante quanto o que foi mostrado em Persona: “Almejo criar títulos que ofereçam uma experiência valorosa de autorreflexão através de uma jornada, enquanto se controla personagens com os quais os jogadores possam se reconhecer”.

Grandeza imperfeita

Após rasgar elogios ao jogo, ainda é preciso pontuar alguns problemas que não foram corrigidos em P5R. Ainda que o jogo esteja muito mais fácil e ainda mais agradável de se jogar, muitos dos acontecimentos novos, em especial, as formas de abrir o conteúdo novo do game, podem passar despercebido por um jogador novato.

Atlus/Reprodução

Não existem muitas dicas ou elementos que indiquem que, ao elevar a amizade com os novos Confidants, o jogador será recompensado com o “quarto trimestre”. E embora eu tenha gostado de ver que todos os novos eventos, interações e cutscenes foram aparecendo gradualmente, do início ao fim da aventura, o conteúdo novo propriamente dito só é liberado após passar por todos os principais acontecimentos do jogo original - e sob certas circunstâncias que podem passar batido.

De toda forma, embora P5R tenhas doses graduais de conteúdos novos ao longo da jornada, a história principal permanece praticamente igual ao game original e, isso não é exatamente bom, pois alguns dos problemas de P5 continuam presentes, como os diálogos homofóbicos e machistas, por exemplo. 

Por falar em diálogos, ainda existem muitas conversas expositivas e interruptivas, no sentido de que os personagens constantemente relembram ou atrapalham o fluxo do gameplay para conversar sobre o que jogador deve fazer nos Palácios, ao invés de deixá-lo explorar e descobrir as resoluções dos enigmas por si só.

Para jogadores veteranos isso pode atrapalhar um pouco, mas felizmente, é possível acelerar as conversas - o que eu não recomendo, pessoalmente, pois pode-se perder alguma porção do conteúdo novo nesse ínterim.

Outra problemática que permanece desde P5 é a questão da falta de representatividade, como bem pontuado pela Vice. Para um jogo que tem como principais temas a revolta e a revolução, abordando a liberdade de ser quem você quiser e tomar controle do seu futuro; para tanto, retratando um grupo de oprimidos e flertando com minorias que a sociedade julga e excluí porque eles se opõem às regras... P5R não melhora em nada neste aspecto.

Além disso, as controversas cenas em que algumas personagens femininas são sexualizadas, por exemplo, continuam na nova versão, mantendo uma certa falta de clareza para com algumas temáticas do game original. Afinal, isso vai contra um dos objetivos do próprio jogo, pois um dos vilões é um pervertido e pedófilo.

Algumas conveniências no roteiro também permanecem e as explicações para alguns dos acontecimentos continuam confusas. Mas, enfim.

Atlus/Reprodução

Para quem está jogando P5R pela primeira vez, nada disso deve fazer diferença; mas para quem jogou P5 e retorna nesta nova versão, repetir tudo, inclusive os tropeços na narrativa, pode parecer maçante.

Não existem dúvidas de que a Atlus melhorou - e com louvor - o gameplay e otimizou o ritmo do jogo para que os jogadores veteranos possam aproveitar melhor tudo que P5R traz de novidade (basta ler todas as mudanças em relação a P5 e as adições descritas acima). 

E se por um lado não houveram mudanças na estrutura da história original e os grandes acontecimentos permanecem inalterados; por outro, houve um esforço para corrigir alguns erros como, por exemplo, a aparição de alguns personagens logo no início do game, como é o caso de Makoto e de Haru, além de toda a reconstrução do Confidant de Akechi, como já mencionado. 

Desta forma, quando colocados na balança, o peso entre os tropeços que permaneceram e as novidades que aprimoraram a experiência se equivalem. Mesmo assim, existe espaço para melhorar, sempre há.

As reclamações acima podem soar, portanto, como “querer caçar pelo em ovo”, mas considere que eu já havia jogado P5 antes, então a ansiedade pelo conteúdo novo falou mais alto ao longo das 163h jogadas.

Ainda assim, foram 163h de jogo em que eu não me arrependo de nenhum minuto gasto. É um dos melhores jogos (re) lançados em 2020, sem nenhuma sombra de dúvidas.

Vale adquirir pelo preço cheio ou não?

Atlus/Reprodução

O fato de que a Atlus está cobrando US$ 60 por Persona 5 Royal é um debate constante entre os consumidores de videogame. Como alguém que consumiu Persona 5 em seu lançamento e saiu extremamente satisfeita da experiência, é difícil negar que o anúncio desta nova versão não tenha me causado pensamentos controversos.

Na nova versão, logo nos 5 primeiros minutos de jogatina, uma palhinha do conteúdo novo é atirado na face do jogador para atiçá-lo e fazê-lo continuar jogando até de fato, chegar nas novidades. E isso se estende ao longo de toda a aventura principal. 

Todo o balanço do que é novo, aprimorado ou errado está descrito no review acima e, de forma geral, eu saí ainda mais satisfeita da experiência que tive em P5R. Então, de forma direta e objetiva, o conteúdo novo justifica o preço cheio?

A resposta curta é: para quem nunca jogou, sim; e para quem já jogou a versão original e está muito curioso com as novidades e/ou planeja revisitar esta exímia experiência de JRPG, sim também, mas com algumas ressalvas. Talvez valha a pena esperar por uma promoção, ainda mais neste período conturbado de pandemia por conta do COVID-19, em que muitas pessoas estão economizando como podem - e com razão.

Seja por preço cheio ou com desconto, o custo benefício é também excelente, já que Persona 5 Royal é ainda mais longo que Persona 5 por conta de todas as novidades que traz. Ainda assim, vale avisar que o novo game, tal qual sua versão original, exige certo entendimento de inglês para que seja compreendido em sua totalidade, afinal, sua trama e seu gameplay são densos e o jogador passará horas lendo diálogos e explicações - e infelizmente não existe localização em português.

Para finalizar, fica a reflexão para os consumidores de jogos da Atlus (eu inclusa) quanto aos futuros projetos da companhia: é possível incluir conteúdo in-game através de atualizações por download.

Atlus/Reprodução

Por ser um conteúdo habilitável apenas na reta final do jogo, muitos debatem a ideia de que P5R poderia ser um DLC, ainda que existam pequenas parcelas (e personagens) em meio a essas novidades que são apresentadas aos poucos desde o início da história.

Ainda assim, a incorporação de novas cutscenes e até de capítulos ou mecânicas não é algo impossível e, já aconteceu, por exemplo, em Final Fantasy XV. Se a Square Enix consegue, por que a Atlus não? Com exceção dos DLCs, o jogo base se tornou uma experiência completamente diferente desde seu lançamento em 26 de novembro de 2016, após todas as melhorias através de atualizações por download que foram acrescentadas.

A resolução perfeita para isso, ao meu ver, seria que a Atlus tivesse lançado atualizações gratuitas com os novos personagens, para assim, instigar os fãs a rejogarem a campanha principal desde o início para acompanhar a história dos novos Confidants. Depois, a empresa poderia ter lançado um DLC pago contendo apenas o “quarto trimestre”, para que os gamers pudessem conferir o desfecho dessas tramas.

Em um mundo ideal, esse formato funcionaria. Todavia, além de lançar uma versão definitiva do jogo por US$ 60 com 30h+ de conteúdo novo - habilitável, de fato, apenas no fim da aventura do game original -; a Atlus também lançou mais um pacote de DLC que custa US$ 60 (cujo conteúdo é completamente questionável). No fim das contas, somos nós que financiamos esse comportamento e permitimos que ele continue.

A previsão é que, com a saída de Hashino do P Studio, a franquia Persona (e talvez Shin Megami Tensei, também) passe por uma reformulação geral, o que inclui revisar as políticas internas de planejamento, para que esse tipo de relançamento de edição definitiva não aconteça mais. É uma prática constante desde P3 e P4 também tem sua versão melhorada, mas os tempos são outros. É hora de mudar - para melhor, se possível.

Nota do crítico