Review: Return to Monkey Island é um adventure divertido sobre envelhecer
Guybrush Threepwood volta mais velho, não muito mais sábio, mas ainda com o mesmo charme
Na vida, é impossível se fazer tudo o que se quer, ou que se sonha fazer.
Independente dos grandes e pequenos sucessos (e fracassos) que surgirem pelo caminho, há coisas que você simplesmente não vai conseguir fazer ou realizar, pelos mais diferentes motivos.
... Mas, às vezes, uma oportunidade que se imaginava estar perdida reaparece décadas mais tarde. Mas, justamente por tantos anos terem se passado, sua perspectiva sobre ela muda, assim como o mundo ao seu redor.
É, ao meu ver, é sobre isso que se trata Return to Monkey Island, mais novo jogo da clássica série de adventure da LucasArts, especialmente por ser o primeiro game da franquia com envolvimento do criador Ron Gilbert desde Monkey Island 2: LeChuck's Revenge, lançado há 31 anos atrás em 1991.
Mas, antes que isso comece a soar melancólico e depressivo demais, é importante dizer que o jogo trata disso do jeito mais divertido, charmoso e engraçado possível, procurando manter a mesma linha de comédia dos jogos anteriores da série — mas dessa vez vindo de um pessoal com cabelos mais grisalhos.
Return to Monkey Island começa praticamente do ponto em que Monkey Island 2 terminou, revelando mais sobre as circunstâncias sobre o final... inesperado daquele jogo.
Depois disso, seguimos novamente com nosso meio-que-intrépido protagonista Guybrush Threepwood, que após anos de aventuras parte em uma nova jornada para finalmente descobrir qual é o Segredo da Ilha dos Macacos.
(Explicando a piada do jogo inteiro, o primeiro jogo da série se chama The Secret of Monkey Island, mas — como muitos fãs não deixaram Gilbert esquecer nessas últimas décadas — ninguém descobre segredo nenhum na Ilha dos Macacos)
A questão é que, anos e anos se passaram desde que Guybrush esteve na Ilha Sopapo e seus arredores, e as coisas mudaram bastante de figuras: há novas lideranças entre os piratas, o comércio da ilha (incluindo a clássica loja vodu) ou fechou, ou está prestes a fechar às portas, e o velho e bem vendedor de barcos Stan está preso.
Mas algumas coisas nunca mudam, especialmente a tendência de Guybrush e seu arqui-rival, o pirata zumbi LeChuck, terem a mesma ideia ao mesmo tempo, já que ele também está preparando sua própria expedição para a Ilha dos Macacos — com muito mais sucesso do que nosso herói, diga-se de passagem.
A partir daí, o jogador deve guiar Guybrush pelas mais bizarras e curiosas missões possíveis, de jornada espiritual para montar um esfregão até convencer piratas em quarentena que limões são bons para tratar escorbuto, mas sem citar fatos científicos por trás disso.
(Tenho certeza que Gilbert e o pessoal do estúdio Terrible Toybox não pensaram em nenhum paralelo com o mundo real sobre isso)
O principal trunfo de Return to Monkey Island é justamente a sensação de que esse é um jogo de Monkey Island, mas sem se perder totalmente em nostalgia, sabendo e aprendendo como modernizar a experiência.
Assim como os jogos anteriores, os objetivos e missões são repletas de soluções exotéricas, combinando itens e encontrando formas de resolver problemas que podem não fazer sentido no mundo real, mas funcionam na lógica do jogo.
... Na maioria das vezes. Não seria um Monkey Island, ou um jogo de adventure que lembre os clássicos dos anos 80 e 90, sem algum quebra-cabeças ou desafio que te faz querer arrancar os cabelos de frustração — e infelizmente hoje em dia eu não tenho mais tanto cabelo para arrancar do que antigamente.
Pelo menos, os desenvolvedores tiveram a misericórdia de criar um livro de dicas especiais, que o jogador pode consultar a qualquer momento para te apontar na direção certa — primeiro de um jeito mais suave, depois de forma mais direta.
E tenho certeza que deve ter algum tipo miserável de pessoa que sente que usar isso "rouba" da experiência. Mas eu estou velho, e às vezes eu simplesmente quero seguir em frente, e você pode passar o jogo inteiro sem nem interagir com as dicas, se quiser.
Além disso, para quem quiser uma experiência menos difícil e mais focada na história, há também um modo casual para jogadores ocupados. Para mim, parece um bom meio-termo em vários níveis.
Uma das grandes mudanças do jogo está no estilo de arte, que é significativamente mais cartunesco e estilizado do que jogos anteriores da série, o que levou um grande número de fãs insuportáveis até a atacar Ron Gilbert no seu blog.
Embora não tenha me impressionado com estilo visual inicialmente, comecei a apreciá-lo com o tempo, especialmente nos momentos de animação mais elaborados, me fazendo pensar em desenhos da Nickelodeon dos anos 90 durante vários momentos.
Ao meu ver, a arte funciona como uma extensão do jogo e da história sendo contada, e ela faz isso muito bem.
Falando nisso, como falei acima, a história é divertida e tem um charme especial, graças especialmente aos personagens curiosos, engraçados e às vezes mais multifacetados do que parecem à primeira vista.
Não só isso, o jogo pode ser uma sequência direta de Monkey Island 2, mas ainda respeita o legado que veio depois dele, com várias referências e elementos de jogos que vieram depois dele, como a caveira Murray e referências ao game da Telltale Tales from Monkey Island — que, pra ser justo, tinha a participação do Dave Grossman, outro criador da franquia que também voltou para esse novo projeto.
Mas admito que achei que a história perde um pouco a força em suas últimas horas, especialmente porque ela parece ir em uma direção em que Guybrush teria que arcar com as consequências dos seus atos malucos de protagonista de adventure game, mas que acaba não sendo bem assim.
O final também me levou um tempo para digerir, embora certamente esteja em linha com os dois Monkey Island originais. Porém, ao matutar um pouco, e ler a mensagem final dos desenvolvedores no caderno de Guybrush, é uma conclusão mais satisfatória, que me levou ao pensamento no início desse review.
Return to Monkey Island não é perfeito, mas é provavelmente o jogo mais honesto e genuíno que Ron Gilbert, Dave Grossman e o pessoal da Terrible Toybox poderia trazer. Em uma indústria de games cada vez mais abertamente cínica, é bom sentir um pouco de leveza para variar.
E o público brasileiro pode curtir o jogo sem medo, já que ele vem localizado em português do Brasil.