Hitman - 1ª Temporada | Crítica

O experimento episódico de 2016 que deu certo

Por Bruno Silva 20.01.2017 12H06

À primeira vista, Hitman é um jogo sobre assassinato. Mas, na verdade, é também um jogo sobre oportunidade: é saber a hora certa e o local certo para a abordagem do alvo, passar no momento em que o guarda não vê, aproveitar a ida do banheiro de um personagem cuja vestimenta representa um valioso disfarce.

O mais recente game da franquia traz consigo uma coleção de fases nas quais as oportunidades montam um quebra-cabeças dinâmico. Mas é notável e digno de elogios o esforço da Io-Interactive em trazer experiências que atendem a qualquer tipo de jogador, do mais casual ao que pede por desafios, em um título que tinha tudo para ser o mais complexo de uma saga já conhecida por sua peculiar dificuldade entre os jogos de ação furtiva.

O novo Hitman é uma amálgama do que deu certo em seus dois antecessores diretos. Esta estrutura de cenários caóticos e repletos de maneiras para exterminar seus alvos vem de Blood Money, lançado na transição entre as gerações PS2/Xbox e PS3/Xbox 360. É de lá que vêm a ideia de que é possível eliminar seu inimigo, em um único cenário, envenenando seu vinho, derrubando um barco em cima dele ou com o tradicional e eficiente tiro na cabeça.

Já seu sucessor direto, Hitman: Absolution, game já lançado em plena era de PS3 e Xbox 360, lhe entrega os Contratos, um modo multiplayer que garante ao título da Io-Interactive um montante expressivo de conteúdo, ao permitir a criação de missões nas quais qualquer personagem do cenário pode ser um alvo.

A volta ao mundo em seis contratos

Tudo isso é embalado em um conteúdo com um método de distribuição... ousado, para dizer o mínimo. A Io-Interactive vendeu Hitman em episódios, iniciando a primeira temporada do jogo em março e soltando episódios mensalmente até novembro. A versão completa, em edição física, sai no fim de janeiro.

O timing não foi dos melhores: recebido por uma comunidade recém-saída de uma polêmica envolvendo a falta de conteúdo em títulos de alto orçamento com o caso de Street Fighter V, o novo Hitman foi deixado de lado por muitos, já que, de fato, o conteúdo era escasso no primeiro mês de lançamento.

Entretanto, o cenário mudou rapidamente. Ao contrário de exemplos negativos que se espalharam por 2016, Hitman já trazia consigo todos os modos de jogo necessários para a experiência proposta pela Io-Interactive, e, valendo-se de sua prolífica comunidade, os criadores de Contratos trataram de lotar o jogo de boas missões antes mesmo do Episódio 2 estrear.

Ao todo, são seis episódios, cada um com um mapa. Eis uma breve avaliação de cada um deles:

  • Paris: O primeiro episódio - e a primeira missão do Agente 47 após os tutoriais - traz um palácio enorme no qual é realizado um desfile de moda, e o seu objetivo é matar os dois organizadores: Viktor Novikov e Dalia Margolis. Grande, amplo e com múltiplas maneiras de entrada e saída (com direito a vários disfarces), este é o cenário ideal para nos introduzir as mecânicas e sistemas de progressão do jogo.
  • Sapienza: O melhor mapa de Hitman, combinando o ambiente amplo e social mostrado em Paris com um segundo tipo de cenário mais tradicional da franquia, com menos personagens em cena e uma segurança mais elevada. Para completar todos os objetivos do local - assassinar o biólogo Silvio Caruso, sua assistente, Francesa de Santis, e eliminar a mostra do vírus letal desenvolvido ali -, é necessário infiltrar-se em um nível que vai afunilando em crescentes camadas de dificuldade e complexidade.
  • Marrakech: O terceiro episódio tenta repetir a estratégia do segundo, desta vez com três tipos de ambientes diferentes, mas acaba não surtindo o mesmo efeito. Em vez de acomodar os cenários em camadas, eles são colocados um do lado do outro - uma embaixada, uma escola transformada em base militar e as ruas da cidade marroquina. Por ser um local de caminhos constantemente vigiados, é o nível que requer mais paciência do jogador, obrigado a utilizar táticas mais convencionais de jogos de ação furtiva.

  • Bangkok: Não é o melhor mapa de Hitman, mas com certeza é o mais divertido. A missão que consiste em assassinar o líder de uma banda de rock alternativo e seu advogado rende as oportunidades mais curiosas de se assistir, como, por exemplo, tocar bateria ou passar pelos exigentes critérios de limpeza de um cliente em um hotel luxuoso à beira do rio Chao Phraya.
  • Colorado: Certamente o mais desafiador dos níveis da primeira temporada, já que se passa em um complexo militar no qual todas as pessoas presentes estão armadas (e desconfiam de você com facilidade). O número de alvos também é alto: são quatro membros-chave de uma milícia, cada um com uma especialidade e cercado de guardas com uniformes diferentes. É a fase que requer mais paciência, mas contém bons desafios.
  • Hokkaido: O último nível da primeira temporada é o que mais exige furtividade do jogador, em um hospital nas montanhas japonesas cujas portas se abrem dependendo da sua vestimenta. A aparente ausência de armas pode parecer um obstáculo, mas, uma vez que se resolve a charada da roupa, rondar pelos diferentes ambientes do centro médico torna-se uma diversão extra.

Risco e recompensa

Neste ponto, o lançamento episódico mostrou-se ser um dos maiores trunfos do novo Hitman, pois cada cenário é rico, denso, enorme e extremamente detalhado, sempre trabalhando com a ideia de diversas chances a serem tomadas a todo instante. Isso pode ser aprendido com as Oportunidades, que permitem a 47 se aproximar mais facilmente do seu alvo (e rendem histórias engraçadas) e, ao mesmo tempo, familiarizar-se com o cenário.

Todo este conhecimento vem a tona na hora de resolver as inúmeras missões existentes no modo de contratos. Cumprindo com a promessa de ser uma experiência colaborativa, o novo Hitman formou uma grande comunidade de jogadores que, voluntariamente ou não, mostraram aos colegas como extrair o máximo de cada cenário do jogo até o lançamento do próximo.

A Io-Interactive não ficou de braços cruzados e também adicionou desafios legítimos em cada mapa, como os Contratos de Agravamento, uma série de cinco assassinatos que precisam ser feitos em série, sempre em nível crescente de dificuldade. Todos eles são muito mais exigentes do que qualquer missão da história, e claramente requerem um conhecimento prévio de mapa, caminho de guardas e exigência de disfarces.

Tudo isto culmina nos Alvo Elusivo, uma brilhante experiência na qual um determinado personagem a ser assassinado aparece em um mapa por um tempo limitado, e você só pode tentar a missão uma vez. Até mesmo encontrar o alvo é difícil, já que ele não é detectado pelo sistema de Instinto (uma mecânica similar ao Modo Detetive de Batman: Arkham). Este é o ápice da experiência do novo Hitman, na qual os riscos são os mais altos e o domínio do mapa, com todas as suas imprevisibilidades, precisa ser pleno.

As falhas do formato

A distribuição por episódios se provou ótima para Hitman, especialmente no que diz respeito à criação de uma comunidade e aos modos multiplayer, mas também deixou alguns pontos fracos no jogo. O principal deles é a trama, que, como em diversos títulos divididos por capítulos, não avança nada e leva a um final insatisfatório.

O jogo conta a história de origem do Agente 47, sua introdução à agência ICA e como se formou a relação de cumplicidade entre ele e a agente Diana Burnwood, que lhe entrega suas missões. A trama envolve uma conspiração na qual uma outra agência estaria no comando da ICA e arma o cenário para um conflito entre o protagonista e um vilão misterioso, mas este personagem desaparece misteriosamente nos episódios finais, em uma resolução que prefere deixar as respostas para a já confirmada segunda temporada.

A interface do jogo, bela e minimalista na maior parte do tempo, acaba sendo um pouco confusa para alguns momentos de gameplay, especialmente quando você está prestes a ter seu disfarce descoberto. Todas as informações são passadas por meio de frases no centro da tela e não há uma indicação precisa de quando os guardas deixam de te procurar.

No geral, Hitman é a prova de que o formato episódico pode, sim, ser empregado em jogos com orçamentos mais elevados, em uma proposta que, apesar de ser vista com estranhamento inicial, deixou um saldo bastante positivo. Mais focado para quem se interessa no desafio e nos ótimos níveis criados pela comunidade (e pela desenvolvedora), o jogo traz seis caixinhas de surpresas a serem desvendadas e dominadas em um ótimo jogo de ação furtiva.

Hitman está disponível para PlayStation 4, Xbox One e PC (Steam), com uma versão física prevista para 31 de janeiro. O jogo foi testado em um PlayStation 4. Clique no nome das plataformas para conferir o preço na versão digital.

Nota do crítico