"Two ninety nine."
Com essas três palavras, a Sony destruiu os planos da Sega com o Saturn em 1995 em um "anúncio" durante a primeira E3 da história. Entre aspas mesmo, pois toda a declaração de Steve Race, líder do PlayStation na época, foram as palavras "two ninety nine" (duzentos e noventa e nove, em inglês).
Agora o contexto: naquela época a Sega se encontrava em apuros, por sentir a pressão de dois lados: em uma vertente, encontrava-se sua velha rival, a Nintendo, com quem finalmente conseguiu enfrentar de igual para igual na geração do Super Nintendo e Mega Drive; vindo da outra vertente, uma nova e poderosa competidora na forma da Sony Corporation, que após anos de rumores finalmente decidiu entrar no mercado de consoles de videogame.
Ironicamente, a Sega e a Sony brevemente consideraram uma parceria após a Nintendo passar a fabricante do Walkman para trás com um antigo projeto, o Play Station, mas aparentemente as conversas não seguiram em frente - o que, indiretamente, levaria ao eventual fim de uma destas empresas no desenvolvimento de consoles.
Sem contar que a empresa precisava limpar sua imagem com o desastroso lançamento que foi o 32X, o acessório que prometia transformar o Mega Drive em um videogame de nova geração.
O Saturn tinha sido lançado em novembro de 1994 no Japão e preparava seu lançamento em solo americano. O lançamento nos EUA estava previsto para o dia 2 de setembro de 1995 e a publicidade do console dizia que este seria o "Saturnday" (uma brincadeira com Saturday, sábado, em inglês e o nome do console nos EUA).
Porém, no dia 11 de maio de 1995 a Sega anunciou que a chegada do console nos EUA tinha sido alterada para "imediatamente", com direito ao jogo Virtua Fighter incluído na caixa, pensando que seria uma grande jogada de marketing.
"Decidimos trazer o produto ao mercado antes do planejado para largar na frente da concorrência", disse Tom Kalinske, presidente da Sega of America, durante o anúncio. "Começamos a distribuir o Sega Saturn ontem para que, hoje, mais de 800 lojas ao redor dos EUA e Canadá atendam aos nossos clientes pelo preço de US$ 399".
Apoiando-se nesse anúncio audacioso, a Sega revelou mais alguns jogos que chegariam no console como Clockwork Knight, Daytona USA e Panzer Dragoon.
Foi audacioso, certamente. E totalmente mal-planejado.
O anúncio feito às pressas não foi informado para todas as redes varejistas. Toys 'R' Us, Babbage's e Electronics Boutique Sofware estavam preparadas para atender à demanda, porém Best Buy, Walmart e Kay-Bee Toys, não foram informadas da mudança de planos e, em retaliação, se recusaram a vender os consoles imediatamente.
Lembre-se: esta era uma época antes do varejo online como o conhecemos hoje. Ao alienar duas das maiores lojas dos EUA, a Sega deu um tiro de espingarda no próprio pé, limitando significativamente o estoque de Saturns no país.
De qualquer forma, isso só ficaria mais claro em alguns dias, e foi mais uma pá de cal do que qualquer outra coisa. O destino do console seria selado em questão de minutos.
Depois da conferência da Sega, os corredores do Los Angeles Convention Center foram tomados pelo burburinho, afinal, apenas 30 mil unidades do Saturn estavam disponíveis na América do Norte.
Mas nada havia preparado os executivos da Sega para "two ninety nine".
A diferença de US$ 100 no preço de lançamento nos EUA fez toda a diferença. Era o preço de dois jogos - na época cada game custava US$ 49.
E, como uma torcida extra na faca, antes de virar presidente da Sony Computer Entertainment, Steve Race - que deixou o púlpito sob aplausos após as três palavras - era um dos principais executivos de marketing e vendas da... Sega of America, servindo inclusive sob a tutela de Tom Kalinske.
O Sega Saturn parou de ser fabricado apenas três anos depois com apenas 9,26 milhões de unidades vendidas. O PlayStation chegou a 102,49 milhões de unidades, e não só ainda é até hoje uma das plataformas mais vendidas de todos os tempos, como transformou a Sony no titã da indústria de games que continua até hoje.
E a combinação do preço mais elevado do Saturn, junto de seu lançamento desastroso nos Estados Unidos, foram fatores importantes para seu fracasso.
Mas, vale notar que a Sony também teve ao seu lado diversos produtores que preferiram se dedicar ao PlayStation por ser um console muito mais fácil de se desenvolver jogos em 3D - o Saturn fazia gráficos 3D, mas o desenvolvimento era muito complexo.
Foi então que a Sega decidiu se unir com a Microsoft para criar o Dreamcast. Mal sabiam eles que a história seria tão trágica quanto...