Street Fighter V | Crítica
Um caminho completamente novo pela frente
Street Fighter é um clássico. Pioneiro, ditou as regras para todo um gênero dentro do mundo dos videogames, os jogos de luta. Golpes que viraram referência, personagens que fazem parte da cultura pop mundial e toda uma filosofia baseada nas artes marciais que diz respeito a educação e disciplina. Street Fighter V continua esse legado e daqui em diante coloca a franquia mais próxima de uma geração que não usufruiu do ambiente (nem sempre) saudável dos fliperamas de rua.
Os jogos de luta não são mais tão famosos quanto eram no passado. Os consumidores não são mais os mesmos, chateiam-se facilmente dada a dificuldade de execução de certos movimentos e logo perdem a motivação. Street Fighter V tem como principal proposta diminuir essa barreira invisível que impede as pessoas de notarem um real crescimento em suas habilidades.
O novo game da Capcom é talvez o mais “fácil” de todos. Claro que estamos falando de um jogo de luta, e as inúmeras camadas de profundidade vão surgindo com os anos de prática e estudo da comunidade que joga. Mesmo assim, a proposta de SFV é a de uma mecânica simplificada, combos fáceis e eficientes que qualquer um corajoso o suficiente para se dedicar um pouco consiga executar.
O ritmo dos combates mudou bastante. Os botões nunca foram tão importantes dentro da série. Saber quando utilizar um soco médio ou um chute forte será mais vantajoso que aprender o comando do Shoryuken do lado direito da tela (claro que isso é importante também, pratique!). Os "footsies", aquele balé estressante que deixa os nervos dos jogadores (e de quem estiver assistindo) à flor da pele serão a grande estrela do espetáculo. São os footsies que vão separar os homens das crianças dentro das batalhas ranqueadas de Street Fighter V.
Substituindo o Focus Attack de Street Fighter IV, agora temos o V-Trigger, o V-Skill, e o V-Reversal que são as principais ferramentas de SFV. Cada um dos lutadores tem nessas habilidades sua própria identidade, únicas e exclusivas. O acionamento delas é o mesmo para cada um dos lutadores, os dois botões fortes para o V-Trigger e os dois botões médios para o V-Skill, mas o seu funcionamento varia de acordo com o personagem.
O V-Skill é uma habilidade nativa, que não requer o uso de nenhuma barra de energia. Sua utilização, contudo, é essencial para o preenchimento de uma barra vermelha no canto inferior da tela, que representa o V-Trigger. Esta, por sua vez, é uma ferramenta muito útil que pode ser usada de diversas maneiras: pode transformar seu personagem (Ryu, Ken, Necalli, Cammy, Bison, Chun-Li, Birdie, Karin, F.A.N.G., Laura, Zangief) ou lançar um ataque único, mas que pode ser usado de inúmeras maneiras (Nash, Rashid, Dhalsim, Vega, B.Mika). E o V-Reversal é um artifício utilizado para quebrar o ataque constante do oponente (é preciso apertar os três botões de soco ou chute e colocar o direcional para frente enquanto defende) ao custo de um gominho da barra de V-Trigger.
A princípio pode parecer uma desvantagem utilizar um personagem que não se “transforma”, mas aos poucos descobrimos que não é bem assim. Todas as ferramentas são boas, mas é preciso aprendermos como utilizá-las da forma correta. Isso, infelizmente, não será revelado a você da noite para o dia.
SFV conta com 16 personagens iniciais e existe um plano para o lançamento de mais seis até setembro. O elenco conta com oito personagens clássicos, alguns deles completamente remodelados (Dhalsim, Ken e Vega são outros personagens, praticamente), quatro personagens remanescentes de Street Fighter Zero (R. Mika, Nash, Karin e Birdie) e quatro lutadores inéditos (Rashid, Laura, Necalli e F.A.N.G.).
Ausências sempre vão existir, mas os DLCs devem suprir um pouco essa carência. A primeira temporada de DLCs contará com Alex, de Street Fighter III, sendo entregue em março, além de Balrog, Juri, Ibuki, Guile e Urien, todos sem uma ordem específica por enquanto. A ideia é aumentar o elenco de lutadores durante toda a vida útil do jogo, que não será curta.
A Capcom mudou drasticamente o seu modelo de negócio. Não espere por Super Street Fighter V ou Ultra Street Fighter V. A ideia principal é de que este seja um game que o jogador compra apenas uma vez. A partir do disco lançado no dia 16 de fevereiro, a Capcom vai trabalhar com um sistema de atualizações mensais constantes via DLC.
A diferença, no entanto, é que esses DLCs poderão ser adquiridos com um dinheiro virtual chamado Fight Money. A moeda corrente em SFV pode ser adquirida vencendo embates no modo ranqueado, finalizando as histórias dos personagens e enfrentando as hordas quase infiitas do modo sobrevivência. A partir de março uma série de desafios diários será inserida no menu principal do game, facilitando a obtenção do FM aos jogadores que ainda tem dificuldade em vencer partidas contra outros jogadores.
A similaridade com o universo de jogos como League of Legends ou Heroes of the Storm não é coincidência. E não para por aí. A maior meta de SFV para 2016 e anos futuros é criar essa base virtual de jogadores divididos por rankings, para que eles possam desenvolver suas habilidades de forma justa e competitiva. O sistema de ranqueamento de jogadores online já conta com um sistema de classes (Rookie, Bronze, Silver, Gold, Platinum, Diamond, Master, Warlord e Hero, cada uma delas com suas subdivisões), impedindo que um calouro enfrente de cara um jogador exageradamente competente, por exemplo.
Ainda de olho em modelos de negócio dos concorrentes indiretos, para a Capcom Pro Tour 2016, a empresa já definiu que os 16 melhores jogadores classificados no ranking online (oito do mundial e dois de cada região) estarão com suas vagas garantidas para as grandes finais de dezembro.
A unificação da jogatina entre as plataformas que vão receber Street Fighter V também é novidade para a empresa. Tanto jogadores de PlayStation 4 quanto os de PC (via Steam) poderão se enfrentar sem limitações. Para a Capcom é uma facilidade trabalhar um único sistema de ranqueamento no game, mas é preciso que o mesmo seja capaz de reconhecer trapaças como os famosos “Tool-Assisted Characters”, ou personagens controlados via um programa específico que os fazem lutar sozinhos, bastante comuns dentro do mundo dos jogadores de PCs. Mas isso é um problema que deverá ser resolvido à medida que for reconhecido pelas autoridades vigentes.
O online robusto de Street Fighter V é graças a nova ferramenta da Capcom, intitulado Kagemusha (ou Guerreiro das Sombras). Ele trabalha com um sistema de rollback (ao invés da “câmera lenta”, a luta acelera ou retorna a um certo ponto de acordo com os ajustes que o netcode acha necessário) e passou por uma incessante fase de testes durante o ano de 2015. Até o momento, o Kagemusha parece ser bastante competente.
Não pudemos experimentar o servidor aberto oficialmente até o término deste texto, mas durante a semana anterior e todas as fases de testes ele mostrou-se bem impressionante, pareando batalhas praticamente sem latência alguma contra jogadores do Brasil inteiro e até da América Latina. Claro que, quando jogamos contra pessoas localizadas em outros continentes, o jogo não é tão fluido, mas o problema está muito mais nas costas da estruturação da transmissão de dados mundial do que exclusivamente do Kagemusha.
Tudo indica que a Capcom ficará de olho em como as pessoas jogam Street Fighter V daqui por diante. A Capcom Fighters Network (CFN) registra todos os movimentos dos jogadores, calculando porcentagens em cima de todos os seus números. Além das óbvias porcentagens de vitórias e derrotas, a CFN terá o registro, por exemplo, da sua taxa de sucesso contra personagens específicos, inclusive dos golpes que tiveram mais eficácia em suas lutas.
A CFN fará a marcação em tempo real de quantas pessoas estão jogando SFV no mundo, representadas no mapa mundi que fica ao fundo da tela, possibilitará a criação de uma lista de rivais para que você possa monitorar todos os seus avanços e facilitará a visualização de replays de quaisquer jogadores que quiser assistir.
A atual história que acompanha o game na sua compra é curta, com três a cinco lutas por jogador. As ilustrações são feitas pelo artista japonês Bengus, conhecido por seus trabalhos no primeiro Street Fighter e em dois jogos da série Alpha, entre outros. A trama segue os acontecimentos de Street Fighter IV, criando uma ponte de ligação entre os jogos até Street Fighter III, cronologicamente o último da franquia. Uma coisa que precisa ser destacada aqui é que Street Fighter V não conta com um modo arcade (vença os lutadores até encontrar o chefão).
Todo o jogo está localizado para o português brasileiro, exceto as vozes dos personagens (que podem ser colocadas em inglês ou japonês). O trabalho de localização segue o mesmo padrão de qualidade encontrado nos demais jogos da empresa (DmC, Resident Evil, etc) e o resultado é bastante satisfatório, inclusive com a clássica menção “Ih, ó o cara”, de Ken Masters.
A busca pelo mais forte e o caminho do auto aperfeiçoamento, assim como Ryu sempre o faz não será fácil, e para Street Fighter V essa analogia nunca pareceu mais precisa. O game que será vendido a partir do dia 16 de fevereiro chega “incompleto”, se comparado a todas as versões anteriores já lançadas. Os desafios diários serão incluídos em março, a história principal em junho e o balanceamento sempre que for necessário. Mesmo os lobbies para oito jogadores e o modo espectador vão ter que esperar um pouquinho, pelo menos até o final de fevereiro.
Street Fighter V é um respiro dentro do cenário dos jogos de luta. Um reinício tanto para a empresa, que lidava com SFIV há quase oito anos, quanto para os jogadores, meio acomodados sem novos desafiantes para se enfrentar. Ainda deve crescer muito esse menino.
Street Fighter V está disponível para PlayStation 4 e PC. O game foi testado em um PlayStation 4.