Mulheres no CBLoL: Uma vitória, ainda que tardia
Depois de anos, Riot contrata mais três mulheres para compor a equipe de talentos do CBLoL 2021
O cenário competitivo profissional de League of Legends no Brasil teve seu início em 2012, dois anos após o lançamento oficial do jogo. Nos oito anos de história do campeonato, podem-se perceber algumas semelhanças entre as edições: O time vencedor do torneio dizendo que vai dar o melhor nas competições internacionais, as farpas no Twitter que envelhecem mal ou viram meme e a mais fácil de notar: a ausência de mulheres em cargos de destaque nas transmissões oficiais do CBLoL.
O histórico das mulheres no CBLoL
Com “cargo de destaque”, quero dizer mulheres que aparecem nas câmeras, que estão desempenhando um trabalho para o público. Em oito anos de campeonato, tivemos apenas duas delas no CBLoL: Tawna, que foi apresentadora e repórter de 2017 a 2019, e Rafaela Tomasi, que chegou para substituí-la após esse período, e continua nas transmissões até hoje. Em 2015, tivemos também a inscrição da primeira jogadora num time: Geovana “Revy” Moda foi contratada pela falecida KaBuM! Black, mas não chegou a jogar.
Em 2020, a Riot começou a dar mais chances às mulheres em suas transmissões. Para fazer parte do novo elenco do Depois do Nexus, o programa semanal de análise das partidas do CBLoL, foram contratadas duas figuras já conhecidas pelos entusiastas dos campeonatos amadores e femininos: Letícia Motta e Ravena Dutra, que foram apresentadas ao público do CBLoL de maneira sutil, mas firme, dando suas opiniões e fazendo sua voz valer dentro do programa.
Também em 2020, foram anunciadas duas mulheres no competitivo: Gabriela “Harumi” foi contratada pela Rensga (que até então fazia parte do Circuito Desafiante) como Suporte reserva da equipe, e chegou a jogar uma partida, tornando-se a primeira mulher a realmente jogar uma partida oficial. No mesmo ano, Júlia “Mayumi” foi anunciada como suporte reserva pela INTZ após disputar a Superliga ABCDE 2019 pelos Intrépidos, mas acabou não estreando oficialmente no CBLoL. O resto da história vocês já sabem.
Mudanças com o Sistema de Franquias
Não é muito difícil de perceber que 2020 foi utilizado para preparar o terreno para o que viria em 2021. Com o início do sistema de franquias, as organizações teriam mais liberdade para contratar jogadores sem precisar pensar apenas nos resultados e nos números e ficar com medo do rebaixamento, pois ele foi extinto para 2021. Além disso, foi implantado o sistema de Academy, onde cada organização conta com um time secundário para jogar essa liga.
O resultado dessas mudanças tão simples foram 5 mulheres inscritas nas escalações oficiais. Ariel “Ari” e Larissa “Lawi” foram inscritas pela Academy do Cruzeiro Esports. Gabriela “Harumi” se mantém na Rensga por mais um split, agora pela Academy. Elizabeth “Liz” não podia ter escolhido um nick melhor, já que vai fazer o L na Academy da LOUD em 2021. Tainá “Yatsu”, que fez sua estreia na Liga Loading em dezembro de 2020, continua segurando o manto da INTZ.
O fato de todas essas mulheres terem sido inscritas nas Academys demonstram que as organizações ainda possuem um certo receio em inserir mulheres em seus elencos primários, pois mesmo que possa haver a troca de jogadores entre a line CBLoL e a Line Academy, essa substituição é apenas uma possibilidade. Por outro lado, acredito que é muito mais positivo pro cenário (e para as próprias jogadoras) serem inscritas na Academy e jogarem, de fato, que ser inscrita no CBLoL e passar a Etapa inteiro no banco.
Comparado aos anos anteriores, podemos dizer que houve uma melhora significativa. Claro que demorou cerca de oito anos para essa melhora chegar, e foi uma longa jornada para as mulheres conseguirem fazer isso acontecer. Também devemos levantar o fato de que, sem contar os reservas, o competitivo de League of Legends brasileiro possui cerca de 100 atletas, e as mulheres representam apenas 5% desse total. Ainda existe muito receio, sem dúvidas.
A nova equipe de Casters
Uma das coisas mais importantes que podem ser observadas no anúncio da nova equipe de transmissão é que, no final das contas, a Riot não reproduziu esse receio nas suas contratações para casters em 2021, já que chegaram com o pé na porta trazendo mais três mulheres para compor a nova equipe. Ravena Dutra, que já era da casa, foi oficializada como comentarista. Layze “Lahgolas” e Maria Júlia “Fogueta” são as novas casters da Academy.
Finalmente, depois de oito anos de espera, vemos um movimento de contratação no qual mulheres não parecem estar lá pra bater algum tipo de “cota de representatividade”. Lahgolas e Fogueta vão dividir o casting da Academy com outra dupla de casters, e só. O fato delas dividirem o casting do campeonato não é por pura conveniência, mas sim porque, tradicionalmente, os casters se alternam durante as transmissões. Simples e limpo.
Não houve um grande hype, não houve um anúncio gigantesco, não houve um outdoor dizendo "DÊEM ATENÇÃO AQUI, CONTRATAMOS MULHERES”. Parafraseando Mickaelly Schimidt, “Quando há uma mulher jogando (…) Nunca nos tratam com naturalidade: somos sempre uma anomalia.”, e, no final, essa noção de que somos uma anomalia só existe por conta da forma que somos tratadas, e não pelo que realmente somos.
Uma longa jornada
A Riot deu um grande passo contrário a esse pensamento ao anunciar as novas participantes da equipe de maneira tão singela. Se existem tantas jogadoras, porque não existiriam comentaristas, analistas e narradoras também? Falando de quantidade, eu finalmente consigo me sentir representada, pois hoje eu posso afirmar que metade dos casters da Academy 2021 são mulheres. Metadinha, 50%. E demorou oito anos para que conseguíssemos atingir esse marco tão básico e ao mesmo tempo tão importante: a igualdade.
Ainda estamos longe do ideal, mas mesmo assim, mais perto do que nunca antes. Lahgolas e Fogueta iniciaram sua carreira como casters há menos de um ano, e já conseguiram conquistar seu espaço no profissional. A entrada delas irá instigar outras mulheres a seguirem seus sonhos, e futuramente, teremos muito mais casters mulheres, e assim o ciclo continua. Por isso a representatividade é tão importante: ela faz com que as minorias sintam que existe um motivo para correr atrás dos seus sonhos, mesmo que alguns deles pareçam tão distantes.
De modo geral, 2021 começou de uma forma muito melhor para a comunidade feminina de LoL que qualquer outro ano, o que demonstra que a luta das mulheres nos últimos anos valeu a pena. Significa que, mesmo que um pouquinho, a nossa voz foi ouvida.
Agora, nos resta esperar para ver e, principalmente, torcer pelas nossas meninas, nunca esquecendo da posição que ocupamos no meio e da importância das nossas vozes.
Juliana "Moondded" Alonso entusiasta de Esports desde 2013. Fundou a Sakuras Esports, em 2018, e depois disso não parou mais de falar e lutar pelo cenário feminino e pelas mulheres nos Esports. Você pode acompanhar mais sobre ela em @moondded nas redes sociais.