Febre de Bola - Nick Hornby
5 ovos

Fãs de futebol, mesmo que não entendam nada da liga inglesa, deveriam ler Febre de bola (Ed. Rocco) ao menos um vez por ano (durante o curto intervalo entre os campeonatos, talvez), para confirmar que todos aqueles momentos de alegria, ou desespero, não são exclusividades só deles. Em seu primeiro romance, o escritor Nick Hornby conta suas experiências como torcedor fanático do Arsenal, time inglês de futebol desde sua primeira ida ao estádio Highbury Park, acompanhado pelo pai (recém-divorciado da mãe), até um chato jogo no meio de uma temporada em que ele sabia que seu time não tinha a menor chance de ser campeão, mas que, mesmo assim, não conseguiu ficar em casa, pois sabia que os gunners precisavam dele. No meio do caminho, ele explica ou ao menos tenta achar motivos para tamanha estupidez e faz refletir sobre esse esporte praticado por 22 pessoas que está acima de cores, credo e religião. E (perdoem-me pelo que vou dizer agora), em algumas horas, pode até ser mais importante que as mulheres.

O livro é contado em três grandes capítulos (1968-1975, 1976-1986 e 1986-1992), que por sua vez são subdivididos por jogos. Cada partida é uma história diferente e tem um contexto próprio, que serve para falar do que era viver na Inglaterra naqueles anos 60, 70, ver o hooliganismo explodir nos anos 80 e, vez ou outra, contar - de uma forma que só ele consegue - a emoção que é ver o time do coração vencer um campeonato.

Três trechos em especial são de tirar o fôlego:

O primeiro, intitulado Pelé, narra o jogo Brasil 4 x 1 Tchecoslováquia, que aconteceu no dia 3 de junho de 1970. Era a estréia da seleção canarinho na Copa do Mundo do México e Hornby diz que até então ele sabia mais sobre Ian Ure do que sobre o maior jogador de futebol de todos os tempos. Foi nesta Copa que aconteceu o primeiro grande confronto entre europeus e sul-americanos em Copas do Mundo que todo mundo realmente pôde acompanhar, pois a televisão já não era mais um luxo como antigamente. Ele lembra também de como chorou ao ver o English team perder para o Brasil em um jogo cheio de superlativos (a maior defesa de todos os tempos, o melhor carrinho de todos os tempos, dois dos mais belos gols perdidos de todos os tempos...) e como tentaram na escola fazer algo parecido com as maravilhosas jogadas mostradas pelo time brasileiro, mas que, ao perceberem que era impossível, logo deixaram aquilo para lá.

Os outros dois remontam às tragédias nos estádios Heysel (19/05/85) e Hillsborough, (15/04/1989). Na primeira, quando tudo estava certo para ele curtir a final da Copa dos Campeões da Europa entre Liverpool x Juventus junto com alunos para quem dava aula de inglês, torcedores do time bretão presentes no estádio belga foram para cima da torcida italiana. Acuados, os juventinos ficaram pressionados contra um muro, que acabou cedendo. Depois disso, a bagunça foi generalizada e 39 pessoas acabaram morrendo, entre os escombros ou pisoteadas. Já o que aconteceu no Hillsborough, quatro anos depois, foi ainda pior em termos de vítimas. Na semifinal da FA Cup entre o mesmo Liverpool e o Nottingham Forest, 96 torcedores morreram - culpa de uma superlotação. Hornby discorre sobre o que aconteceu, dá suas versões para as causas e confessa, entristecido consigo mesmo, que nem isso o afastou dos estádios.

É difícil fazer jus às 245 páginas do livro neste espaço tão pequeno. Hornby, como ele mesmo diz, não era muito talentoso com os pés, mas prova desde o início que seu diferencial está mãos, que escrevem de um jeito gostoso e fluente, e no jeito simples, mas ao mesmo tempo muito profundo de falar sobre o mesmo assunto por tanto tempo sem torná-lo chato. Febre de bola é uma prova de que amar um time de futebol é realmente um ato muito idiota, mas - como todo amor - inevitável.