“Todo mundo do time está empolgado com Overwatch. É o tipo de jogo em que tudo parece estar certo”, comenta com animação o designer de som Paul Lackey, que veio ao Brasil especialmente para o lançamento do game da Blizzard, cujos servidores nacionais entram no ar nesta terça-feira (23). “Já trabalhamos em muito jogo em que isso não acontecia. Ter a equipe certa, as ideias certas, o suporte certo… é como fazer magia.”

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Com diversas fases de testes beta e uma história contada por meio de curtas animados e histórias em quadrinhos, Overwatch se apoia com força nos próprios personagens - cada um deles repleto de personalidade, e isso também se aplica à sonorização. “Quando você ouve a Tracer, sabe que é ela por seus passos, seu teleporte, suas pistolas. Demos ao som uma identidade tão única quanto a das silhuetas de cada personagem, como eles ficam na tela”, diz Lackey.

Para conseguir essa personalidade única, Lackey incluiu sons específicos quase inaudíveis em gestos dos perosnagens. “Widowmaker, por exemplo, é bem sorrateira e calculista. Quando ela mira com seu rifle, há um pequeno sibilar de cobras escondido ali, porque ela é uma pessoa de sangue frio. Tentamos colocar esses sons aos quais as pessoas reagiriam. Você não ouve claramente, mas está lá como uma pista subconsciente.”

Lackey conta que, apesar de ter colaborado a produzir um jogo repleto de personalidade, seu trabalho dá certo quando é imperceptível. “Foi importante criar um ambiente de imersão, para manter o jogador lá dentro. Se ele ouve um passo fora do padrão, quebra o jogo”, diz.

Por último, mas não menos importante, o som também funciona como auxílio de gameplay, de modo a entregar informações sem poluir a tela. “Você precisa saber quem está fazendo o quê e aonde, e muitas vezes as pessoas estão fora da sua visão. Não apenas isso, mas também dizer quando estou sendo curado, o quanto de vida vou recuperar. Tiramos tudo de dados do jogo, e podemos manipular dinamicamente o som para dar esses dados ao jogador em tempo real”, diz Lackey.

Até mesmo as vozes trabalham assim. “Se o personagem diz algo, é por um motivo”, conta o desenvolvedor. Quando os personagens desferem seus golpes mais fortes, eles sempre dizem a mesma frase. “Primeiro, achei isso horrível. Tínhamso memória o bastante para eles falarem dez frases. Mas isso dilui a importância do golpe. Quando você ouve uma frase como “A justiça vem de cima”, você sabe que é a Pharah e você sabe o que ela vai fazer”, descreve Lackey.

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Captações inusitadas

Exprimir personalidade e informações apenas por meio do som foi uma tarefa que exigiu criatividade de Lackey na hora de gravar. O desenvolvedor conta uma aventura particular neste processo, no qual ele viajou até Detroit, berço da indústria automotiva americana, para captar o áudio de uma fábrica de carros. “Cheguei nesse lugar com máquinas gigantes chapando ferro, montando os veículos peça por peça. Era um balé tecnológico. Fiquei tão maravilhado que quase esqueci de apertar o botão de gravar”, diz. Estes sons acabaram dando vida a Volskaya, a fábrica russa que serve como um dos 12 mapas do jogo.

Outra viagem importante de Lackey foi para o parque de diversões Legoland, na Califórnia. “Lá, havia um braço mecânico que articulava em várias direções. Este som você ouve no herói Bastion e também em partes de Volskaya”, conta.

Por ser responsável pelo design de som de Overwatch, Lackey acabou bem próximo da concepção de Lúcio, o personagem brasileiro do game que tira suas habilidades de combate da música. O designer conta que os sons do personagem vieram de samples de outras músicas, reconstruídos do zero por Chris Giampa.

Lackey morou por três meses no Brasil e vê no personagem fortes influências nacionais, como o futebol e a música, mas acredita que sua vivência brasileira será mais útil se a Blizzard decidir criar um mapa inspirado no país. “Já conversamos sobre isso, porque o Brasil é cheio de lugares ótimos. Se isso acontecer, vou saber como os táxis soam, ou como é a energia das cidades.”

De um projeto cancelado a 9,7 milhões de jogadores

Os números parecem corroborar a “magia” descrita por Lackey no início do texto: com 9,7 milhões de jogadores em sua fase de testes beta aberta, no início de maio, Overwatch já parece ter dado certo antes mesmo de chegar às lojas. É uma resposta extremamente positiva para um título que, em muitos aspectos, poderia ser visto como uma aposta arriscada para a Blizzard: é o primeiro universo inédito da empresa em quase duas décadas, com uma ambientação (a Terra) e um gênero (FPS) até então inexplorados pelo estúdio.

A sensação de sucesso se mistura a de alívio quando se sabe que Overwatch carrega consigo alguns dos elementos de Titan, o misterioso projeto de MMO que a Blizzard planejou como sucessor de World of Warcraft por sete anos até cancelá-lo em 2014.

Lackey, que trabalhou nos dois projetos, diz que ambos são bem diferentes: “Quando estávamos desenvolvendo Titan, você poderia perguntar a 60 pessoas sobre que tipo de jogo era e teria 60 respostas diferentes. Em Overwatch, você poderia perguntar a 60 pessoas diferentes e teria a mesma resposta.”

O designer de som conta que o momento em que a equipe responsável pelo jogo descobriu que tinha algo diferente em mãos após ver o design de Tracer. “Durante o desenvolvimento, tivemos esse foco agudo no que estávamos fazendo, e acho que ele veio quando nosso primeiro herói ficou pronto. Quando vimos o visual dela, o que ela poderia fazer, foi quando todo mundo viu o quanto esse título é especial.”