Chegou a hora de tirar a poeira dos espadões, fuzilarcos e berrantes de caça.
Três anos após sua primeira passagem pelo Nintendo Switch, Monster Hunter retorna aos portáteis – formato no qual a série foi cultivada – trazendo consigo todo o aprendizado obtido em World.
Tratado pela Capcom como o sexto jogo da linha principal da série e a sequência direta para World, Monster Hunter Rise supera seu predecessor com um foco maior na mobilidade dos caçadores e com um acabamento técnico impecável.
Após ser admitido pela guilda como um dos caçadores responsáveis pela proteção de Kamura, o protagonista tem como missão explorar as regiões que cercam o vilarejo e enfrentar enormes monstros como pássaros que cospem veneno, aranhas gigantes e imponentes dragões.
Melhor descrito como um simulador de caça fantasioso do que como um RPG, Monster Hunter apresenta os enfrentamentos entre homem e monstro de uma maneira muito única. Os detalhes importam: coisas como a refeição antes da caçada, a escolha das armas, o posicionamento das armadilhas e a familiaridade com o cenário fazem toda a diferença nas batalhas, que podem facilmente durar mais de meia hora.
Monstros chamam a ajuda de seus bandos, brigam com outras criaturas em disputas territoriais, caçam quando estão com fome e até fogem para seus ninhos quando estão fracos. O processo de descobrir os comportamentos das diferentes espécies é dinâmico e envolvente, e resulta em um conhecimento que também pode ser utilizado como arma nas caçadas.
Como em jogos anteriores da série, a aventura pode ser enfrentada totalmente de maneira solitária, mas brilha mesmo no modo multiplayer, que permite que grupos de até quatro pessoas partam atrás de presas.
Para quem já é familiarizado com a série, a maior novidade de Rise é o foco na mobilidade, que toma a forma de duas novas criaturas que o caçador leva como companheiras de caçadas (além dos Amigatos, que também estão presentes).
A primeira delas é o Amicão, um parceiro Canyno que não apenas luta lado a lado com o caçador como também serve de montaria. Quanto está montado, o jogador consegue utilizar itens de recuperação e até mesmo coletar recursos, movimentando-se em alta velocidade pelos cenários sem precisar se preocupar com o consumo da barra de energia.
O sistema é inspirado pela mecânica de montarias recrutáveis de World, mas acelera a ação de uma maneira muito mais satisfatória por não ter qualquer tipo de limitação de acesso – todos os caçadores podem usar seus Amicães assim que o jogo começa.
Já a outra criatura é o não tão carismático, mas igualmente útil Cabinseto, cujo uso transparece a inspiração da Capcom no jogo do Spider-Man da Insomniac. Presos às manoplas do caçador, os insetos expelem um tipo de teia que o jogador pode usar para se lançar para frente, para cima, ou até mesmo se pendurar no ar como um pêndulo para realizar saltos ousados. Utilizando-os de maneira inteligente, é possível até mesmo escalar paredes correndo.
Os Cabinsetos também atuam como substitutos melhorados da garra Prendedora de Iceborne, garantindo aos caçadores acesso a ataques especiais únicos que variam de arma para arma, e permitindo que eles montem os monstros que estão enfrentando. Se em World “montar em um monstro” significava ataca-lo de perto, porém, em Rise você assume o controle da montaria, podendo usá-la para golpear outras criaturas.
A soma das novidades resulta em uma experiência muito mais fluida, em que os jogadores raramente precisam parar de se movimentar por qualquer motivo.
Tudo isso deve impactar bastante quem saltou de Generations Ultimate direto para Rise, sem ter contato com o que aconteceu na série no tempo que ela ficou longe do Switch. Fatores como a inexistência de telas de carregamento durante missões, o enxugamento da lista de itens e a automação da combinação de recursos, que surgiram em World, tornam a experiência de caça muito mais simples e veloz do que era da última vez que a série tinha aparecido em um portátil.
Mas a surpresa é que Monster Hunter Rise melhora muito a experiência até mesmo em comparação com World.
A coleta de itens, por exemplo, é muito mais rápida, e pode ser realizada até mesmo quando o caçador está montado em seu Amicão. Há até mesmo exemplos de pequenos insetos e outras criaturas com os quais o caçador interage automaticamente ao toque, obtendo seus benefícios sem qualquer interrupção.
Na forja, a progressão de equipamentos também foi simplificada pela adoção de um sistema de ‘crafting’ parecido com o das armaduras em camada de World. Muitas vezes, em vez de pedir por partes de monstros específicas na hora de forjar sua nova espada, o ferreiro consegue reaproveitar quaisquer materiais originários daquela criatura que você conseguir encontrar.
Monster Hunter Rise é um trunfo no quesito acessibilidade – especialmente para os padrões da série, que passou mais de uma década enamorada pela própria burocracia.
Apesar de parecer ser apenas “mais do mesmo” em vídeos de gameplay, Monster Hunter Rise representa enormes avanços para a série, que enfim entendeu que os fãs não querem gastar o tempo parados na frente de um cristal coletando minérios, mas sim utilizando as complexas mecânicas de combate da série para encontrar novas maneiras de derrubar inimigos monstruosos. Ao agilizar a ação, a Capcom consegue afunilar os jogadores em direção ao que realmente importa.
Mas a lista de trunfos de Monster Hunter Rise abrange mais do que apenas a mecânica de jogo.
A exemplo do clássico de PSP Monster Hunter Portable 3rd, Rise busca inspiração na estética do Japão feudal para criar a atmosfera de Kamura – um vilarejo com séculos de história, e que quase foi destruído tempos atrás por conta de uma invasão de monstros ensandecidos.
O comprometimento da Capcom com a estética do jogo resultou em um dos mundos mais envolventes da série. Todos os elementos da experiência se conectam ao redor deste tema. A (excelente) trilha sonora tem instrumentos e vocais que remetem a enka. Os vídeos de apresentação dos monstros são narrados como poemas tradicionais japoneses. Até mesmo os enormes pratos feitos da cantina de World foram trocados por espetinhos de dango.
Felizmente, a tradução para o português brasileiro é muito boa, e não desperdiça as referência e trocadilhos que o texto original usa para dar ainda mais personalidade ao cenário. Há alguns erros de concordância de tempo verbal e termos esquisitos, mas a presença de nomes como “Dango da Maromba” torna difícil reclamar.
Mas talvez o aspecto mais surpreendente de Monster Hunter Rise seja a maneira como o Switch, com todas as suas limitações técnicas, se mostrou à altura do desafio de abrigar a sequência para o belíssimo Monster Hunter World.
Você pode contar os pixels se quiser, mas Rise é um deleite visual no mesmo nível que World. Ele está entre os títulos com os gráficos mais impressionantes da plataforma, e roda bem até mesmo com o Switch no modo portátil.
Em termos de direção de arte e qualidade de animações, seguindo a tradição da série, Rise não decepciona. Os cenários têm, sim, uma densidade menor de vegetação e detalhes do que os mapas de World; mas, em contrapartida, eles são muito mais abertos e escondem mais segredos por permitirem que os jogadores escalem paredes e criem seus próprios caminhos em meio às montanhas e desníveis.
Com uma quantidade de monstros comparável ao que World tinha em seu lançamento, misturando criaturas clássicas e inéditas em uma proporção de 2 para 1, Rise tem uma progressão constante de dificuldade que culmina nas batalhas contra os monstros Alfa – versões mais fortes de inimigos que você enfrenta ao longo da jornada. É uma trajetória previsível, que já foi vista em vários títulos anteriores da série.
O que não era previsível é o fato de que Rise tem a melhor lista de monstros debutantes desde Monster Hunter 4: criaturas como o Magnamalo têm sequências de ataques nunca antes vistas na série, e obrigam os jogadores a utilizarem a verticalidade do cenário e as novas mecânicas de combate ao máximo. No geral, os novos inimigos são muito mais criativos do que os que surgiram em World.
O clímax da aventura também oferece algo de novo: durante o Frenesi, jogadores devem partir para a Fortaleza na linha de defesa contra invasões de monstros, participando de missões caóticas que remetem aos dias de Lao-Shan Lung nos primeiros títulos da série.
Grupos de monstros atacam de uma só vez, e os caçadores precisam depender de instalações como canhões e balistas para proteger Kamura. Ao longo das batalhas, jogadores ganham acesso a ainda mais instalações, que dão à ação um certo toque de tower defense.
O caos acaba diluindo o aspecto da estratégia de combate, mas a ação espalhafatosa diverte e oferece uma boa quebra de ritmo para uma aventura que certamente durará dezenas ou até centenas de horas.
Monster Hunter Rise é um dos melhores jogos disponíveis no Nintendo Switch, e já desponta como destaque em 2021.
Mesmo carregando o pesado fardo de ser a sequência para o jogo mais vendido da história da Capcom, o novo título consegue expandir a proposta de World, acelerando e desburocratizando ainda mais a ação, ao mesmo tempo em que revoluciona a série com um nível de mobilidade nunca antes visto. Ainda há muito espaço para melhorar a estrutura do multiplayer online, mas, de resto, é acerto atrás de acerto.
Feliz é o fã de Monster Hunter, que pode dormir com a tranquilidade de que o futuro de sua série favorita está nas mãos de quem sabe o que faz.
- Lançamento
26.03.2021
- Publicadora
Capcom
- Desenvolvedora
Capcom