Perseverança, por Tinowns

Desistir nunca foi uma opção para o mid laner tricampeão do CBLOL 2022 pela LOUD

Thiago "tinowns" Sartori Jogador Profissional

No ano que vem, em 2023, completo dez anos de carreira de jogador profissional de League of Legends. Muito tempo, né?

Parando para pensar agora, esses quase dez anos passaram voando. Eu e grande parte da comunidade quase nunca lembramos quanto tempo se passou desde a primeira vez que eu competi oficialmente, lá no CBLOL 2013 pela Nex Impetus, o meu primeiro time “profissional”.

Sou macaco velho no cenário, mas nem todo mundo me via assim - como as pessoas viam caras como Revolta, brTT, micaO. Em parte, isso é minha culpa mesmo.

Em 2014, venci o meu primeiro CBLOL e fui para o Mundial daquele ano com a KaBuM. Aquele time que bateu a Alliance na Fase de Grupos e ajudou a eliminar os campeões europeus, classificando a Cloud9 e criando o meme “This is for KaBuM!” que tanto é lembrado pela comunidade.

Tudo parecia em curso para uma carreira vitoriosa.

E então, quase sete anos se passaram até eu ter uma segunda chance de me provar em palco internacional. Em 2021, jogando o MSI pela paiN Gaming.

Sete anos.

Sete longos anos.

Sete anos de trabalho, de manter o meu sonho de jogar fora vivo o tempo todo.

Sete anos para me transformar finalmente em um jogador profissional de verdade.

Sete anos de perseverança.

Eu sempre tive a ideia de ser pro player desde que me conheço por gente. Nada mais passava pela minha cabeça. Talvez pela convivência com o meu irmão, Felipe, também conhecido como UtinOwns (já viu de onde eu tirei meu nick, né?). Ele jogou Age of Empires competitivamente na época que nem existia salário, nem nada. Até chegou a ganhar uma WCG e ir para a Alemanha jogar em 2008, e eu achava aquilo o máximo.

Isso despertou algo em mim, queria jogar, ganhar campeonatos. Falava isso para os meus professores na escola e no cursinho, e eles achavam que eu era maluco. Confundiam até com “Design de Jogos”!

Comecei a jogar LoL ali pelo meio de 2012, e menos de um ano depois eu já estava em um elo alto o suficiente para chamar a atenção de uma galera, e assim eu entrei na Nex Impetus. Conseguimos passar das classificatórias e chegar ao CBLOL 2013, que seria a primeira competição da minha carreira. Pra ser sincero, naquele começo do cenário as coisas pareciam muito fáceis, tudo acontecia de maneira muito rápida, muito amadora.

Lembro até hoje de sair de Praia Grande e ir para São Paulo antes do CBLOL morar na casa do Digolera, que era o AD Carry e o dono do time. Ficamos lá pra fazer um pequeno “bootcamp” em uma época que praticamente nenhum time tinha uma gaming house. Almoçava e jantava bolacha, salgadinho e refrigerante. A minha cama era um colchão no meio do closet do quarto do Digolera, e eu era solado direto pelo Kami nos treinos jogando em um monitor quadrado de 14 polegadas.

A gente só estava vivendo, era o máximo.

Sendo bem sincero, quando paro pra pensar no começo da minha carreira, principalmente aquela KaBuM de 2014, que foi a equipe que joguei depois da Nex, sinto que perdi muito tempo.

Era o começo de tudo no cenário, claro, mas eu era muito imaturo, não tinha responsabilidade. Estava vivendo o meu sonho, mas era um moleque que saiu da escola, foi pra casa de uns amigos, jogou um CBLOL… Tudo parecia muito fácil. Aproveitei ao máximo, mas vejo que talvez se tivesse as pessoas certas do meu lado me ajudando, eu teria evoluído muito mais rápido.

Talvez pela influência dos jogadores que joguei no começo, não tive essa evolução, tanto que a maioria deles hoje está fora do cenário. Eles também eram moleques, mas me deixei levar por tudo que acontecia, pela falta de conhecimento, pela falta de uma comissão técnica pra pegar na minha mão e me ensinar. Jogava, me esforçava, mas não da maneira certa, só estava seguindo o rumo natural das coisas.

Essa falta de foco e a galera preferindo curtir a vida adoidado foi o ambiente que eu comecei e cresci no começo da minha carreira, e na verdade se arrastou por um bom tempo, já que continuei jogando com as mesmas pessoas nos próximos anos. Faltou responsabilidade de entender isso.

Aquele time de 2014, do Mundial, era completamente brigado. Desconfiávamos uns dos outros por coisas mínimas.

Foto: Riot Games
Foto: Riot Games

Lembro de uma história lá no Mundial que a gente estava treinando contra a Fnatic (sim, conseguimos treinos bons naquela época) e algo de muito errado deu no bot, que era formado pelo Minerva e o Dans. O clima já estava uma merda, todo mundo quieto. Depois do jogo, um atropelo, o Dans foi pro banheiro e a gente começou a conversar sobre assuntos aleatórios e rir, e quando ele voltou ficamos em silêncio de novo. Ele achou que estávamos falando dele e veio pra cima de todo mundo, tivemos que controlar ele.

Esse era o time que ganhou da Alliance no último jogo, e isso seguiu por muito tempo. mudamos algumas vezes a line-up, mas essa imaturidade, a falta de responsabilidade, acabou indo junto com esse time e comigo.

Foi uma época boa, me diverti muito e viveria tudo de novo, mas falando pessoalmente hoje reparo que atrasou muito a minha carreira. Não há espaço para esse tipo de coisa hoje em dia, as coisas são muito mais profissionais. Naquele tempo não tínhamos ideia.

Aquele time eventualmente se desfez, mas eu, Minerva e LEP fomos para a CNB depois de um ano de 2015 muito ruim, que foi um choque de realidade pra gente. Fomos pro Mundial no ano anterior e não fizemos nada no primeiro ano de estúdio no CBLOL. Na reta final, ainda tomamos uma multa da organização, o que criou um racha com o elenco. Mudamos de equipe com o sentimento de provar a KaBuM errada, e isso carregou a gente até a final do CBLOL 2016 na CNB.

Pra você ver como a gente tinha a cabeça no lugar errado. A primeira vez que chegamos na final depois de 2014 foi na força do ódio, pra provar que a KaBuM estava errada. Perdemos para o Exodia na final, não tinha como vencer daquele time. No ano seguinte, 2017, a motivação de provar a galera errada já não existia, e a CNB também trouxe o Vash para dividir posição comigo. Caí em um limbo.

Ainda não entendia que não era sobre provar que as pessoas estão erradas, e sim provar para mim mesmo que eu estava no caminho certo.

E então, no final do ano, meu celular apitou com uma mensagem.

“Tin, vamos marcar uma reunião? Abraços, PAADA”.

Eu nunca esperava um convite da paiN, sendo bem sincero.

A paiN é o tipo de organização que todo o jogador sonha jogar, principalmente no League of Legends. Mas claro, o Kami sempre esteve lá. Se eu fosse jogar na equipe, era porque algo muito bizarro teria acontecido com ele, tipo perder um braço.

Na minha cabeça ele nunca iria se aposentar, era inimaginável. Não sei quem me indicou, mas eu sabia que o Kami sempre falava bem de mim, que eu era um dos mids mais difíceis de enfrentar, que eu era constante, mas nunca tive um contato muito direto com ele.

Só fiquei sabendo que ele iria se aposentar quando a proposta chegou em mim, em uma reunião na casa do PAADA com ele, Thomas, Vex e Gary, toda a diretoria da paiN na época. Além da informação do Kami, eles disseram que realmente me queriam como titular para o mid. Comentaram também da bot lane e do jungler… só não falaram do top.

Eu já estava disposto a aceitar qualquer coisa para jogar na paiN, um time tradicional, gigante, com uma torcida apaixonada, mas talvez eles não me falaram tudo o que realmente estavam pensando porque eu não era um jogador que mostrava muita responsabilidade, liderança. Entrei sem lugar de fala lá, e aí tomei o famoso “confia na call”.

“Relaxa, Tin, vamos trazer um top laner foda para o lugar do Mylon, confia na gente.”

“Bora!”

Demorou umas duas semanas para fecharmos os contratos e ir para a casa da paiN, já no começo de 2018. No primeiro dia para conhecer o time eu ainda não sabia quem ia ser o top laner. Estava lá sentado na minha cadeira dentro da sala de treinos quando alguém toca na porta e entra…

“Fudeu, o takeshi é o meu top laner.”

Foto: Bruno Alvares | Riot Games
Foto: Bruno Alvares | Riot Games

Eu cresci em times com personalidades muito fortes: Dans, Minerva, LEP. Isso me confundiu muito, e segurou a minha evolução, criou um mindset errado. Eram times que brigavam muito, apesar de sermos amigos. Levei isso comigo por alguns anos, e era de certa forma tóxico. A virada de chave aconteceu quando me afastei da galera do começo e comecei a conviver com outras pessoas e enxergar o jogo e a vida de outra forma.

A paiN foi esse momento de virada para mim.

Eu discutia muito com o takeshi naquele time, e por ele ser um dos maiores mid laners da história do Brasil, talvez até um mid melhor do que eu naquela época, a gente brigava muito, ele pegava pesado comigo. Mas foi uma época que eu aprendi muito, já que ainda faltava muito para eu conseguir sentar com alguém e realmente conseguir trocar uma ideia sobre o jogo, ou em um VOD review falar o que penso. Não tinha essa mentalidade. O takeshi foi um dos caras que me trouxe essa visão, e a galera da paiN também, o PAADA, o Thomas.

Todos esses me moldaram para ser alguém melhor, mas foi uma mudança gradual, não em apenas um split. Demorou algum tempo para me transformar em uma pessoa e um jogador melhor.

O time deu totalmente errado dentro de jogo, e acabamos caindo pro Circuitão logo no nosso primeiro Split. No primeiro que disputamos no Desafiante, mudamos o elenco e trouxemos Ayel, Nappon e Dioud, que estavam parados há praticamente um ano depois do 2017 na RED Canids, mas o time simplesmente não encaixou o suficiente para conquistar a vaga. Perdemos a final para a Redemption por 3-0 e ficamos no Circuitão.

Foi uma das épocas mais difíceis da minha carreira, mas eu sabia que devia continuar
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No ápice da frustração cheguei até a cogitar me aposentar, mas passou muito rápido. Nunca perdi a vontade de querer ser o melhor e disputar títulos. Sempre me vi em situações ruins na carreira e isso nunca me abalou a ponto de realmente cogitar parar de jogar, por isso falo muito em persistência.

Sempre quando dá merda você volta e reflete suas decisões, mas se não deu certo talvez não era pra ser. Foi um momento de grande reflexão, e fiquei muito chateado comigo mesmo por não ter batido o pé. Como falei, não tinha muito local de fala, era uma pessoa que seguia a corrente, mas não percebia isso. Foi um grande ensinamento para mim.

Isso faz parte da construção do jogador. Eu não tinha voz ativa e isso era problema meu, mas também… o que eu tinha feito?

Ganhei o CBLOL em 2014 e fui pro Mundial, e mais nada. Seis anos de carreira e só isso de resultado para falar por mim. Não era suficiente. Era um jogador experiente de tempo, mas sem o calibre de um jogador realmente experiente, e precisava demonstrar isso não só na tomada de decisão, mas na postura no dia a dia, fazer o que é melhor pro time dentro e fora de jogo. Eu não tinha essa moral, mas não fazia por onde também, era meio louco. Nem eu confiaria em mim mesmo naquela época.

Por isso um jogador precisa entender essas coisas se quiser evoluir como profissional. Não adianta você ser novo e talentoso e querer bater o pé para uma organização. Vai tomar um “quem é você na fila do pão”. São dois lados da moeda.

Três coisas aconteceram na minha carreira a partir de 2019 que me trouxeram até o ponto em que estou hoje:

O primeiro é a entrada do Xero para a paiN.

O segundo foi a formação do dream team de 2021.

E o terceiro foi conhecer a Bianca, ou Thaiga, se preferir.

Foto: Bruno Alvares | Riot Games
Foto: Bruno Alvares | Riot Games

O Xero entrou na paiN no final de 2019, antes do começo da temporada 2020 do CBLOL. Ninguém nunca tinha me dado um caminho para seguir, e por não ser proativo eu não corri atrás por conta própria, e o Xero veio para abrir a minha mente.

Imagina um jogador profissional aprender a realmente jogar League of Legends depois de sete anos de carreira. Pois é.

Talvez por isso que eu critico muito as comissões técnicas do Brasil. Foi o Xero que me ensinou a grande maioria do que eu conheço de LoL hoje, principalmente sobre o mid. Se hoje eu sou campeão, muito passa pelos ensinamentos dele.

Todo jogador precisa ter a humildade de reconhecer as suas falhas e sua falta de conhecimento. Antes do Xero eu não entendia isso, colocava a culpa em milhares de outras coisas, além de mim mesmo. Antes eu olhava o mapa e via o que estava acontecendo, mas não conseguia explicar várias decisões que tomava, por que estava me movimentando daquele jeito, onde estava dando recall, por que colocava uma ward. Jogava no automático e no feeling, e isso não é jogar em alto nível.

O Xero é um cara perfeccionista, e é ex-mid laner. Por mais que ele fosse o técnico do time, ele sempre pega mais pesado com o mid, e qualquer erro ele vinha direto para cima de mim, mesmo que, por exemplo, o bot tenha morrido no 2x2. “Eles morreram, mas cadê a sua cobertura de visão para dar segurança à eles?”, ele me cobrava. Tinha dias que eu ficava puto com essa cobrança, mas sempre sabia no final das contas que ele estava certo e queria o melhor para mim.

Todo mundo tem um pouco de ego, o importante é como você lida com isso. Humildade não é fraqueza, é força. Nunca tinha tido uma comissão técnica que me ensinasse a jogar Lol, falasse o que eu tinha que fazer e me desse argumentos, e o Xero fez isso. Peguei respeito muito rápido por ele, e ele por mim. Estávamos com a mesma mentalidade.

Ele queria me tornar o melhor mid laner do Brasil, e eu queria ser o melhor mid laner do Brasil
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Foi importante ter quase seis meses de trabalho com o Xero antes de formarmos aquele time de estrelas, que começou com o Robo, Cariok, eu, brTT e esA no segundo Split de 2020 antes de trocarmos o esA pelo Luci em 2021.

Quando começamos a jogar juntos, eu já era um jogador completamente diferente. Sabia o que fazer, como fazer, tinha atitude e uma voz ativa, e finalmente agora tinha companheiros que sabiam jogar à altura do que eu sabia.

Apesar de estar no cenário há muito tempo, nunca tinha jogado em um dream team. Até via muitas pessoas falando isso sobre mim, da mesma forma que vejo alguns falando sobre o Anyyy: “É um bom jogador que joga em um time ruim”. Era a primeira vez que eu me sentia realmente confortável com o nível de jogo meus companheiros. E claro, o núcleo daquele time que se manteve entre uma Etapa e outra era espetacular.

A liderança do brTT.

As loucuras do Robo.

O talento do Cariok.

Foi uma experiência muito foda e que me evoluiu muito. Depois de passar por aquele time eu me senti verdadeiramente preparado. Hoje tenho ciência de que sou um jogador muito bom, e sei o motivo.

Foi triste a maneira que a nossa jornada acabou, naquela semifinal do segundo Split de 2021, contra a Rensga. Estávamos preparados, mas eu estava com um sentimento estranho naqueles dias antes da série. Nós já sabíamos que o elenco iria se desfazer, e que era a nossa última chance de brilhar. Estava confiante, mas ao mesmo tempo parecia que algo iria dar errado.

Antes da partida, postei uns Stories e a torcida também sentiu.

“Que tom de despedida é esse, Tin? Você ainda tem uma semifinal pra jogar!” disse uma das mensagens.

Mas era o que eu estava sentindo, e foi uma das maiores frustrações da minha carreira. Até hoje acredito que se aquele Split tivesse uma lower bracket, a gente teria voltado por cima e batido a RED Canids na final. Queria ter feito mais história com aquele elenco, e saber que não teríamos uma outra oportunidade acabou comigo…

… mas confesso que doeu menos do que perder aquela final do CBLOL 2020 pra INTZ.

Foto: Bruno Alvares | Riot Games
Foto: Bruno Alvares | Riot Games

Essa foto, tirada pelo Foca, me mata até hoje.

É uma das minhas fotos preferidas, ao mesmo tempo que é uma das que eu mais odeio encarar.

O último jogo, que eu fiquei 0/7/0, foi o único momento da minha carreira inteira que eu sabia que o jogo estava perdido antes do Nexus cair. No meio do jogo eu já sabia, aqui acabou.

A partir da quarta morte eu já estava segurando o choro, sabia que nosso sonho de chegar ao Mundial tinha chegado ao fim. “O que está acontecendo comigo?”, eu pensava.

Ficava pensando em todas as horas que a gente trabalhou, em tudo o que a gente abriu mão pra estar naquele momento lutando por um título e uma vaga no Mundial. Aquele split eu estava voando, tanto que ganhei todas as premiações individuais no final do ano, e senti que deixei meu time na mão. Não joguei 10% do que eu sabia naquela partida. Era uma das melhores fases, um dos melhores times, todos querendo ir pro Worlds, e fiquei com esse sentimento que joguei o sonho de todo mundo fora.

E eu pensei mais neles do que em mim no meio daquela frustração. Estava mais triste por matar o sonho deles do que o meu, por mais que fossem iguais, porque eu só conseguia pensar em retribuir o que eles fizeram por mim. Essa virada de chave da minha carreira e da minha vida. BrTT com a liderança, Robo com as maluquices, o Xero pelos ensinamentos, a paiN pela confiança. Eles me mostraram uma nova carreira e uma nova vida, e eu queria dar esse título pra eles, e isso me quebrou muito.

Depois do jogo, chorei largado.

Fiquei uns 20 minutos sozinho chorando, afastado do time, até o Thomas e a Sharis me encontrarem e tentarem me acalmar. Com o time reunido, pedi desculpas para todos. Voltei em um carro com o brTT e o Kami no banco de trás, e eles me aguentaram o caminho inteiro chorando e pedindo desculpas repetidamente. Lembro que o brTT colocou o braço em volta de mim e falou “Relaxa, Tin, fica tranquilo, está tudo bem”, super calmo, parceiro.

Depois da tristeza veio a raiva, e na casa começamos a falar sobre a partida e os nossos erros, mais uma parte do período de luto da final. O dia estava muito ruim.

Até a Bianca me mandar uma mensagem e perguntar se eu queria um espaço ou se a gente podia se encontrar pra conversar sobre aquela final e distrair a minha cabeça.

A verdadeira grande mudança para estar aqui até hoje foi conhecer a Bianca em 2018.

Ela é uma pessoa muito foda. Teve paciência comigo e me ensinou muita coisa sobre a vida. Como me relacionar mais com as pessoas, como lidar melhor com a internet. Sempre conversamos muito, e foi talvez a primeira pessoa na minha vida que realmente me abri por completo, em partes até mais do que a minha própria família.

Abri meu livro e isso me ajudou muito. As coisas que eu tinha firmes na minha cabeça lá daquele começo, de 2013 a 2017, foram mudando aos poucos por ter conhecido ela. Me tornei uma pessoa melhor, e no final também um profissional melhor por conta dela.

Depois daquela final de 2020, que era pandemia e por isso ela não acompanhou de perto, ela foi uma das primeira pessoas a me mandar mensagem ao ver o quanto eu estava destruído. Ela sempre respeitou muito o meu espaço, então depois de falar com o time eu fui pra casa e ficamos conversando, demos muitas risadas e deu pra esquecer um pouco o resultado, apesar de tudo.

A nossa maior prioridade sempre foi o trabalho, independente de tudo. Mesmo no período em que eu estava na paiN e ela na LOUD, lidamos de maneira muito tranquila. No começo do nosso relacionamento, em 2019, logo fomos morar juntos e isso fez a gente bater cabeça e separar por um tempo, mas sempre mantivemos contato muito próximo e decidimos voltar.

Estamos juntos há muito tempo, acompanhamos muito de perto a nossa evolução pessoal e profissional. Crescemos juntos como pessoas e como profissionais. Ela sabia que era o meu sonho ser campeão jogando uma final presencial. Ela nunca tinha ido num presencial me assistir, a final desse CBLOL 2022 foi a primeira vez.

Naquele abraço tem muito da nossa história juntos, de vibrar um pelo outro, de ela me ver finalmente levantando um troféu. Na hora ela só pulou em cima de mim. Toda hora que eu vejo o vídeo eu choro de novo. Com certeza foi uma das partes mais fodas daquela final pra mim.

Demorou um tempo para esse elenco da LOUD realmente se encaixar. No primeiro Split eu não consegui me impor por estar em um ambiente novo. Estava confortável na paiN e sabia como fazer isso lá, mas vindo pra cá foram grandes mudanças profissionais e pessoais. Uma estrutura e uma organização totalmente novas, eu também estou morando pela primeira vez sozinho, então não consegui me impor e criar laços com meus companheiros. Não encaixava mesmo, batíamos cabeça em coisas pequenas e esse impasse sempre se seguia.

Nesse split já montamos a line-up de maneira diferente. Um Atirador novato que tem a cabeça aberta para tudo e é muito habilidoso. Eu e o Robo conversamos muito sobre o Brance antes de ele entrar na equipe, tínhamos passado por essa situação com o Cariok na paiN e sabíamos qual seria o nosso papel com ele, de passar experiência e estar próximos.

No começo precisávamos micrar ele um pouco, mas ele pegou rápido as coisas e sabe o que fazer direitinho. Foi foda o começo, mas no momento que sentamos pra conversar e tomamos vergonha na cara de entender que se seguíssemos daquela forma não seríamos campeões. Todo mundo começou a trabalhar de maneira unida.

Um dia foi crucial para a gente criar esse time campeão, foi durante a semana pós-quinta rodada do CBLOL, na qual perdemos pra FURIA e pro Flamengo.

Tivemos um treino muito ruim. Criticamos o draft e o jogo bagunçado, e o Von não estava presente porque estava com COVID. No quinto jogo do scrim eu bati o pé, puto, e falei que não iria jogar o quinto jogo, até desliguei o PC. Sentamos todos para conversar e começamos a trocar muita ideia sobre o draft e o nosso estilo de jogo, e montamos um conceito totalmente novo de draft: ordem de pick, quem vai ter pressão, quem vai ser o iniciador e etc, e começamos a seguir ele.

Nisso o Von estava no Discord com a gente só ouvindo tudo, vendo todo mundo gritando e falando, mas chegamos em uma conclusão como equipe, e isso foi o mais importante. Sabíamos que dentro de jogo éramos jogadores bons, já que batíamos em todo mundo nas scrims do começo da Etapa. Se começássemos com o básico no draft e cada um sabendo o seu papel no jogo, o nosso time com certeza iria melhorar, e foi o que aconteceu.

E sobre aquela situação com o Croc, que falaram que eu não fui levantar ele depois do Smite errado e perder pro Flamengo, as pessoas não sabem de nada. Criaram uma intriga que nunca aconteceu.

Era uma situação complicada, estávamos frustrados. Não estávamos putos com o Croc, e sim com a situação como um todo. Depois disso, nunca tivemos mais um 50/50 em partidas. Inclusive, acho que aquilo serviu até para nos unirmos ainda mais, começamos a fazer mais coisas juntos fora de jogo, sair pra jantar toda quarta-feira - e vamos manter isso no México. Isso ajudou a gente a nos unir dentro do jogo, e trazemos isso para dentro também.

Falamos muito da paiN de 2021, mas eu acho que essa LOUD tem mais potencial no Mundial do que aquela paiN teria caso tivesse vencido o CBLOL. É foda falar isso considerando que o Croc, Brance e Ceos nunca jogaram lá fora, mas por tudo o que passamos, por tudo o que eles mostraram na final contra a paiN no Ibirapuera, no Split, toda a pressão e cobrança da torcida e tudo mais, isso me dá confiança de que no Mundial não vai ser diferente.

Claro, eles precisam chegar lá e ter um gosto do que é. A gente sempre fala “ô Brance, relaxa aí, não acha que vai chegar no Mundial batendo no Deft, não é assim que funciona, não, calma, o buraco é mais embaixo”. Parece brincadeira, mas é verdade. Precisamos manter a cabeça. É um time mais sólido e estável, e isso te dá mais chances, já que qualquer erro ou vacilo você é punido.

E sobre mim…

Eu continuo tendo essa vontade de jogar lá fora, e a LOUD é ciente disso. Se aparecer uma oportunidade em uma região major eu vou querer abraçar. Ter a oportunidade de jogar um campeonato internacional com todos os olhos voltados para nós, onde eu consigo mostrar meu jogo, me anima muito.

Sou um jogador diferente. No MSI eu não sabia o que esperar.

Eu não jogava internacionalmente faziam sete anos, muita coisa tinha mudado. Hoje me sinto mais bem preparado, mais confiante e com o mindset certo.

Dormir em um closet, brigar com meu time no Mundial 2014, chegar em uma final de CBLOL na base da raiva, ser rebaixado e voltar por cima com a paiN, aprender de fato a jogar League of Legends depois de seis anos de carreira, fazer parte de um dream team, sorrir, chorar e amar.

Muitas coisas mudaram na minha vida e na minha carreira, menos uma coisa.

A persistência e a vontade de ser a melhor versão de mim mesmo.

Publicado 27 de Setembro de 2022
Editor e Entrevistador Bruno "Butcher" | @leeonbutcher
Editor Chefe Rodrigo Guerra | @guerra
Design Lucas Ferreira | @lucaas_ferreira