Dead Space

Horror de sobrevivência no espaço aposta em narrativa como diferencial

Por Érico Borgo 22.10.2008 17H00

Desde o início do desenvolvimento do game de survival horror Dead Space, a Electronic Arts garantiu que o jogo seria totalmente diferente do que temos hoje no mercado. Os games desse gênero (que nasceu com Alone in the Dark e se popularizou com Resident Evil) geralmente são criticados por roteiristas e escritores por não terem grande preocupação narrativa, apenas desenvolvimento de cenário e jogabilidade. Assim, a EA se propôs um desafio: desenvolver um produto que reunisse o melhor desses dois mundos - algo que tivesse uma história bem delineada, com potencial inclusive para que houvesse desdobramento em outras mídias, e ao mesmo tempo fosse um jogo empolgante, com novidades ao setor.

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Pois a empresa conseguiu. Acertou ao trabalhar simultaneamente a história em três formatos diferentes - uma série em quadrinhos online (por Antony Johnston e Bruce Templeton), um DVD animado e o próprio jogo (cuja divulgação teve até um trailer por James Waan). Os três contam uma trama na qual o prolífico quadrinista Warren Ellis trabalhou. Apesar de inicialmente parecer pouco criativa (descoberta de um artefato misterioso no espaço? 2001 já fez isso em 1966 e a própria EA lançou um game com essa premissa no ano passado, Mass Effect, pra citar apenas dois exemplos), logo a idéia ganha identidade própria e começa a empolgar.

Na trama, um grupo de mineradores em um planeta distante descobre um misterioso artefato. Logo na seqüência toda a comunicação da base com a nave deles, a Ishimura, é perdida. Uma pequena equipe é enviada para iniciar operações de reparos e descobrir o que houve. Mas nos primeiros momentos a bordo, o trio faz uma aterradora descoberta: uma infecção alienígena tomou o controle da nave e seus tripulantes.

O jogador controla um dos integrantes dessa equipe de resgate, o engenheiro Isaac Clarke (referência clara a Isaac Asimov e Arthur C. Clarke, dois dos maiores autores de ficção científica da história). Como no antológico Half Life, o protagonista não é um fuzileiro naval, um ex-combatente ou outro tipo de militar ferradão armado até os dentes, mas apenas um civil - aqui um engenheiro especialista em mineração. Além disso, o personagem não conta com armas convencionais, apenas seu suprimento de ferramentas do dia-a-dia. E deve contar com elas para sobreviver nesse ambiente infestado enquanto tenta descobrir o que aconteceu ali juntando informações fragmentadas.

Visando ampliar a sensação de imersão, os produtores pensaram uma maneira inteligente de apresentar os nacos de história sem as famosas "cut scenes", seqüências animadas sem o controle do jogador. Todas elas são dentro do jogo, com o personagem movimentando-se livremente enquanto assiste a um vídeo ou ouve um relato. Outra solução encontrada para manter o realismo foi a ausência de HUD (a tradicional malha de informações gráfica que é sempre sobreposta à ação). Como se trata de um jogo em terceira pessoa, no qual se pode observar o torso do personagem por trás, todas as informações de vitalidade, energia de armamentos e outros recursos aparecem grafadas nas costas do uniforme de mineração espacial de Isaac Clarke. As telas de seleção de ferramentas, por sua vez, são reveladas através de hologramas que a veste projeta.

E como essas ferramentas não são as tradicionais "espingarda calibre 12", "pistola laser" ou "lançador de foguetes", Isaac tem que se virar como pode - e isso significa uma preocupação com a munição como poucos games têm. E sem poder apoiar-se no tiroteiro descerebrado (acredite, você vai lamentar o desperdício mais tarde), resta ao jogador usufruir do "desmembramento estratégico", novidade que a EA implementou para transformar cada tipo de criatura numa diversão diferente. Entenda: como não são humanóides, cada necromorfo (as criaturas) têm seus pontos fracos diferentes. O clássico "tiro na cabeça" pode não funcionar aqui. Ou um barrigão inchado - que parece até marcado com um alvo - pode esconder centenas de criaturas menores. Assim, o ideal é perceber como esses monstros se movem, eliminar as partes que parecem mais importantes primeiro (pernas? braços? tentáculos?), imobilizá-la e terminar o serviço com um belo esmagamento. Outros recursos incluem um lança-chamas e um gás congelante, ambos voltados para a captação de recursos geológicos, mas que funcionam perfeitamente bem em formas orgânicas. O congelante, aliás, é perfeito para solucionar alguns quebra-cabeças e tornar mais lentos os inimigos mais velozes.

Durante a Comic-Con 2008, dentro de uma sala totalmente escura - algo indispensável para acentuar a sensação de imersão - jogamos a fase "hidropônica", passada dentro de uma estufa que fornece ar e alimento para a tripulação da nave. A ambientação era perfeita... Ouvir os monstros fungando, olhar pra cima e ver um deles caindo sobre você é algo que assusta mais que o mais medonho filme de terror. O difícil é controlar os nervos e livrar-se da criatura depois.

Outro elemento interessante é a gravidade zero. Há diversas fases em que Isaac precisa quicar por ambientes em que a gravidade artificial foi desativada - algo que já seria suficientemente complicado sozinho, mas piora com criaturas fazendo o mesmo, ou flutuando por ali. A ambientação é outro dos pontos altos. Além dos espaços claustrofóbicos da nave, há fases em que Isaac deve lançar-se no espaço - e aí o som simplesmente some, tornando a experiência muda e estranha, como seria no vácuo.

Os gráficos, como esperado em um game de ponta desses, são excepcionais - mas o foco mesmo é no equilíbrio entre narrativa, ação, gráficos, som e ambientação. Com esse conjunto perfeitamente balanceado, o resultado é um dos melhores jogos de horror já lançados. Ou melhor, uma das melhores franquias de horror, já que não deve tardar para que uma versão cinematográfica seja anunciada...