Dead Rising 4 | Crítica

Aventura diverte com caos e protagonista carismático mas está longe de ser boa

Por Arthur Eloi 18.01.2017 11H21

Apesar da morte prematura de Scalebound, a Microsoft teve um ano decente com títulos como Gears of War 4 e Forza Horizon 3. Faltava apenas um nome para fechar seu line-up do ano: Dead Rising 4, game que silenciosamente deu as caras no Xbox One e Windows 10 no auge do hype de Final Fantasy XV e apenas alguns dias após os anúncios de peso do Game Awards e da PlayStation Experience. Agora, considerando sua vasta quantidade de problemas, talvez tenha sido melhor esperar um minuto de silêncio para aproveita-lo.

Após anos vivendo sob a sombra de nomes como Chuck Greene e Nick Ramos, o sobrevivente original Frank West retorna para mais um surto epidêmico em Willamette, no Colorado, onde zumbis causaram morte e pânico em um shopping center da cidade durante o período de compras para as festas de Natal. Motivado pela rebeldia de sua aluna, o fotojornalista retorna à cidade para investigar uma possível participação do governo nesse caos todo.

Conhecida por empurrar alguns dos limites da geração de consoles, seja no quesito gráfico quando deu as caras em 2006 no Xbox 360 e depois no One em 2013, Dead Rising ainda consegue impressionar com suas hordas colossais de criaturas andando pelas ruas ou corredores do shopping. Jogar-se em uma multidão e sair destroçando mortos-vivos é prazeroso e consegue entreter por horas, mesmo com um limitado sistema de combate que não te dá opções de combo além de esmagar os mesmos botões e desferir os mesmos socos e chutes em todas as lutas.

Isso, aliás, pode ser observado como parte de um fenômeno maior: a falta de desafio. A mesma horda citada acima pode intimidar no começo, mas raramente se aventurar nela resultará na sua morte. Com agarrões os zumbis conseguem tirar vida mas a abundância de itens de cura altamente eficientes por todos os cenários anulam qualquer momento de tensão, principalmente levando em conta que upgrades leves já aumentam consideravelmente a quantidade de porradas que West aguenta.

Mesmo as armas compostas, marca tradicional da série, não pedem que você se arrisque entre mortos para conseguir peças e planos. Agora todas - inclusive as não-descobertas - podem ser adquiridas nos inúmeros vendedores encontrados nos abrigos de sobreviventes, utilizando uma moeda que é derrubada aos montes pelos inimigos. É quase como se o game não quisesse que o jogador tivesse preocupações em momento algum, e isso acaba tornando uma experiência supostamente ameaçadora para nosso herói em um passeio pelo parque. Um muito divertido, mas que constantemente corre o risco de cair na repetição e no tédio.

Confusão natalina

Dead Rising 4 parece não saber ao certo como contar sua história. Apesar de todo o tom absurdo da situação, os personagens constantemente tentam se levar a sério demais, colocando questões como crueldade, empatia e até mesmo ética jornalística para o jogador refletir entre um massacre de zumbis e outro. Não só nenhum desses temas é de fato explorado como também nenhuma das narrativas aos quais eles são atrelados é interessante.

Seja a aluna que quer superar o mestre, a comandante militar que preza por sua equipe ou uma comunidade sob o poder de um líder tirano, nenhuma trama é desenvolvida e parece apenas afundar o ritmo e bom humor da aventura. Assim, há uma separação clara entre o tom das ações do jogador com o que a história tenta passar em suas cutscenes e diálogos com NPCs.

Não é que isso seja algo novo para a franquia considerando que os jogos anteriores tinham esse mesmo tom sério, porém os mesmos compensaram tal dissonância com personagens exagerados e motivações igualmente absurdas, algo que podia ser facilmente observado nos chefes dos três títulos. Por esse lado, DR4 parece um retrocesso ao nem ao menos tentar arriscar o humor utilizado pelos desenvolvedores japoneses ou sequer o humor negro de seu antecessor, investindo em uma narrativa batida que junta todos os clichês do gênero: conspirações por trás da origem do surto, possível envolvimento do governo, comunidades de sobreviventes em guerra, a humanização dos zumbis e por ai vai. Por sorte, um elemento central ignora as regras ao seu redor.

Uma Noite Alucinante

Frank West é a verdadeira estrela aqui. O jogo começa estabelecendo um paralelo entre a sua versão mais jovem e egocêntrica com o agora-velho fotojornalista, mostrando que o tempo só o deixou ainda mais sarcástico e ácido. E isso é fantástico.

O humor do protagonista é a melhor parte da experiência, seja quando West interage com outros sobreviventes e ignora por completo o teor dramático de suas exigências ou simplesmente quando deixa escapar comentários irônicos durante suas matanças e aventuras. E a versão brasileira torna tudo ainda melhor.

Assim como no antecessor, o game chega ao Brasil totalmente em português, e a dublagem de Dead Rising 4 acentua todos os pontos positivos com diálogos verdadeiramente boca-suja, principalmente para West que, com boa atuação do dublador Charles Dalla, cospe palavrões para NPCs, zumbis e até para o jogador. É uma decisão ousada e que muitas vezes se vê trocada por alternativas mais saudáveis, porém utilizar uma vasto vocabulário de ofensas aqui casou perfeitamente com a construção do personagem e faz as falas - as do protagonista, pelo menos - soarem naturais.

É impossível não ver em Frank West os traços de um dos maiores nomes do terror-galhofa que o cinema e televisão já viram: Ash Williams, de Evil Dead (gloriosamente chamado de Uma Noite Alucinante no Brasil). Ambos tiveram origens aos moldes do herói armado até os dentes com frases de efeito e eventualmente ganharam versões mais velhas e com personalidades pingando ironia, mas sem permitir que o tempo afetasse a ingenuidade da juventude. Até mesmo o papel e propósito de ambos em suas mais recentes aventuras podem ser descritas por uma frase de West: “Um herói de merda para uma cidade de merda”.

Não há dúvidas de que traços de personalidade de Ash, especificamente a encarnação de Bruce Campbell na excelente série de Ash vs. Evil Dead, influenciaram o protagonista do jogo. A forma como West foi escrito complementa perfeitamente a bizarrice que acontece na tela, e é nesses momentos em que o humor se alinha com o absurdo que o jogo realmente brilha e mostra potencial.

Dead Rising 4 não é péssimo, tendo um combate muito satisfatório e um protagonista que dá aula de caracterização, capaz de te segurar colado na tela por toda a campanha. Infelizmente muitos problemas o afastam de ser uma experiência memorável ou simplesmente boa: a falta de desafio, os personagens esquecíveis, as tramas genéricas e  desinteressantes, as boss fights patéticas e a pura confusão entre o que o jogo quer contar e o que ele de fato mostra.

Não é como se fosse um fracasso também. É possível se divertir com todo o caos que acontece na tela ao matar hordas de mortos-vivos, e o game teve suas críticas médias e até mesmo vendas satisfatórias no lançamento, mas se a Capcom realmente quer que Dead Rising retome o prestígio de uma das séries que ajudou a inaugurar a geração do Xbox 360 e PlayStation 3, será preciso repensar suas escolhas de design e tomar riscos. Enquanto isso não acontece, Dead Rising 4 é aquele título para pegar com desconto e aproveitar no período de seca entre os grandes lançamentos: prazeroso, mas um jogo que deixa muito a desejar.

Dead Rising 4 está disponível para Windows 10 e Xbox One. Clique no nome da plataforma para conferir o preço em suas loja digital.

Nota do crítico