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Desafio não é dificuldade: a filosofia de Sekiro, Dark Souls e Bloodborne

Hidetaka Miyazaki, lendário produtor da From Software, fala sobre Sekiro e mais em entrevista exclusiva

Por Claudio Prandoni 11.07.2018 10H00

Uma das grandes surpresas da E3 2018 foi o anúncio de Sekiro: Shadows Die Twice, novo jogo do aclamado estúdio From Software que será publicado pela Activision.

O jogo chega em 2019 para PlayStation 4, Xbox One e PC e apresenta um herói destemido e munido de um braço prostético capaz de se transformar em diversas armas e até uma corda com gancho para explorar melhor os cenários.

A exemplo de outros títulos do estúdio, como a série Dark Souls e Bloodborne, o desenvolvimento é liderado por Hidetaka Miyazaki, produtor japonês com a fama de criar jogos difíceis e envolventes.

Nessa questão da dificuldade, é só fama mesmo: na prática, Miyazaki-san não se dedica a criar jogos difíceis, mas sim desafios que proporcionem um sentimento de realização ao serem vencidos. Este foi apenas um dos muitos detalhes saborosos que ouvimos do próprio diretor em entrevista exclusiva realizada durante a E3.

Veja abaixo o bate-papo completo:

Quando Demon's Souls foi lançado, em 2009, muito se comentou sobre a alta dificuldade do jogo. Isso se repetiu com a série Dark Souls, com Bloodborne e muitos dos conceitos desses jogos influenciaram outros games nos últimos dez anos. O que você acha dessa influência dos seus trabalhos na indústria de games?

Isso é algo que venho tentando fazer desde Demon's Souls, Dark Souls, Bloodborne e agora com Sekiro.

Não estou me concentrando na dificuldade em si, mas sim na felicidade e empolgação que você tem ao conquistar um desafio.

Esse tipo de jogo que faz você sentir que conquistou algo, que aprendeu com o jogo. É algo que gosto muito.

Não busco exatamente provocar qualquer outro tipo de reação ou influência na indústria de games, mas fico feliz que este tipo de jogo tenha aparecido na hora certa, como parece ter sido com Demon's Souls. Jogou uma luz em algo de valor, que não é na dificuldade, mas sim nesse sentimento de conquista.

Qual é a ideia por trás de Sekiro? O que torna ele diferente de outros jogos da From Software?

Nosso objetivo com este projeto é experimentar novos estilos de game design, para permitir que o jogador viva a aventura de maneiras diferentes.

Ainda assim, temos alguns conceitos que vêm dos jogos anteriores, como os mapas tridimensionais bem detalhados. Isso é algo no qual nos esforçamos bastante nos títulos anteriores e segue intacto em Sekiro, mas agora você vai poder explorar muito mais, já que é possível pular e usar um gancho.

Outro objetivo é permitir que mais pessoas experimentem o êxtase de superar desafios complicados.

Antes dependia apenas da sua habilidade no combate e das estatísticas do seu personagem, agora você tem à disposição todo o arsenal dos ninjas, que permite explorar muito mais o mundo, com uma katana e as armas do braço prostético.

Você quer ser sorrateiro? Vai atacar do alto de uma árvore? Tudo isso vai depender do jogador.

Mesmo com tantas novidades, Sekiro exibe um estilo, uma assinatura, que é claramente da From Software...

Acho que um dos motivos pelos quais Sekiro é imediatamente reconhecido como um jogo da From Software, e isso acontece também com a série Souls e Bloodborne, é o nosso orgulho em fazer games. Jogos mesmo.

E isso significa uma resposta imediata aos comandos do jogador. Você aperta um botão no controle e vê uma resposta na tela. Por exemplo, um ser humano não consegue virar instantaneamente em 180 graus, mas no jogo isso é possível.

O que tentamos fazer com os controles, em conjunto com os gráficos, é criar um mundo baseado na realidade, mas que não seja totalmente realista. Foi assim com a era medieval em Dark Souls, a Inglaterra vitoriana em Bloodborne e agora com o Japão reimaginado da era Sengoku.

A revelação inicial do jogo, no The Game Awards no final de 2017, deixou muitas pessoas imaginando que se tratava de um novo jogo da série Tenchu. Isso chegou a ser cogitado em algum momento?

Tenchu, série que fez sucesso no primeiro PlayStation nos anos 90, foi publicada pela From Software e serviu de inspiração para Sekiro

Não ficamos surpresos que as pessoas acharam isso porque uma das palavras chave quando decidimos criar um game baseado na cultura japonesa era 'ninja'.

Então quando olhamos para nossas produções anteriores é óbvio que Tenchu se destacou. As ideias que existiam em Tenchu combinaram bem com essa temática ninja no novo título que queríamos criar.

No início da produção nós até tivemos a oportunidade de fazer um novo Tenchu, mas na verdade nós nunca desenvolvemos esse jogos, quem criou foi a Acquire, nós apenas publicamos. Então, sentimos que criar um novo Tenchu não resultaria em algo genuíno, seria apenas uma cópia do que já foi feito e isso não agradaria aos fãs e também não seria algo original.

Mesmo assim, buscamos prestar homenagens e manter algumas ideias, como o gancho e os golpes ninja de finalização.

Um das novidades mais comentadas de Sekiro é o sistema de ressurreição. Como nasceu essa mecânica?

Este sistema foi criado com a ideia de equilibrar a ação ninja hardcore com um fluxo de jogo otimizado.

Quando decidimos criar um jogo de ação com ninjas decidimos também que os combates tinham de ser intensos e deixar o jogador perto da morte a todo momento, para sentir o risco do duelo.

Você não é um cavaleiro com uma armadura, aqui você está muito vulnerável e exposto e tem que sentir que cada erro pode ser o seu último. E quando fomos testar isso tudo percebemos que, sim, estávamos morrendo muito, mais do que o esperado, mais do que nos jogos da série Souls ou em Bloodborne.

Então precisávamos criar algo que deixasse mais leve esse processo todo de morrer e repetir tudo com frequência. Sendo assim, criamos a mecânica de ressurreição para tentar manter o medo e tensão das lutas, mas diminuindo o estresse e tensão de ter que fazer tudo de novo.

Além de ser parte importante da mecânica de jogo, acabou se tornando algo que funcionaria muito bem na história. Então, a ressurreição vai aparecer bastante também na trama de Sekiro e na própria personalidade do protagonista: ele é um ninja assassino frio e destemido que pode usar a própria morte para conseguir vantagem sobre os oponentes.

Do que mais você se orgulha nos seus jogos?

Essa é uma pergunta muito difícil de responder de forma objetiva, mas acho que o mais tenho em mente quando estou desenvolvendo, meu objetivo principal não é necessariamente fazer um jogo com os melhores gráficos, mas sim passar para quem joga uma sensação de que 'valeu a pena'.

Ao final da jornada, a experiência tem que ter sido interessante, tem que ter algum valor. Foi assim com os jogos da série Souls e Bloodborne e vai ser assim também com Sekiro.